Este santo foi suscitado pela Providência para contra-restar os efeitos paganizantes do Renascimento, e a revolução religiosa do heresiarca Lutero. Fundou para isso a Ordem dos Teatinos para reformar o clero, e com ele toda a sociedade.
São Caetano de Tiene foi outrora um santo muito popular no Brasil. Há várias cidades, igrejas, capelas e ruas em sua honra por todo o território nacional, embora sua vida seja insuficientemente conhecida. Visamos hoje contribuir para sanar essa lacuna.
São Caetano nasceu em outubro de 1480 em Vicência, na então República de Veneza. Seu pai, Gaspar, conde de Tiene, doutor em Direito e capitão de Couraceiros, possuía castelos e feudos nessa cidade. Era sobretudo um católico exemplar, como o era também sua esposa. Foi pois, num ambiente virtuoso e profundamente religioso, que o menino foi educado.
Quando Caetano tinha apenas dois anos, faleceu-lhe o pai. À mãe, Maria do Porto, coube a árdua tarefa de educar os três filhos que deixava.
Praticamente nada se sabe da vida de estudante de São Caetano. Como ele era muito simples e modesto e tinha horror em aparecer, ficamos privados dos pormenores de sua juventude. Sabemos que cursou os estudos jurídicos e teológicos na Universidade de Pádua, onde era notado por sua doçura, ingenuidade, modéstia e temperança, e já apontado como espelho de sabedoria em meio à libertinagem dos jovens colegas.
Em 1504 Caetano graduou-se doutor em direito civil e canônico e, pouco depois, recebeu a tonsura clerical. Três anos depois foi para a Roma da Renascença, já ordenado sacerdote.
Na capital da Cristandade alguns homens piedosos haviam fundado uma “Companhia”, ou “Oratório do Amor Divino”, tendo como objetivo que seus membros, pelo exemplo, mostrassem ao mundo que a fé e as obras não estavam mortas na Roma do Renascimento, apresentada por Lutero como o centro de todos os vícios.
Os membros desse Oratório visavam também combater as influências paganizantes do Renascimento, procurando reascender o fogo do amor de Deus nos corações, e impedir que a heresia, a libertinagem, o amor aos prazeres, e a paixão dos interesses, o banissem dos corações. Ou seja, visavam uma verdadeira reforma católica. São Caetano entregou-se de corpo e alma a esse oratório.
Na noite de Natal de 1517, quando rezava junto à relíquia do presépio que se venera na igreja de Santa Maria Maior em Roma, Nossa Senhora apareceu-lhe com o Menino Jesus recém-nascido nos braços. Estava acompanhada de São José e de São Jerônimo. A Mãe de Deus depositou o Divino Infante nos braços de Caetano, graça insigne que ele próprio relatou à Irmã L. Mignani, em carta de 28 de janeiro de 1518.
Esse milagre repetiu-se nas seguintes festas da Circuncisão e da Epifania. Por isso São Caetano é representado sempre com o divino Menino nos braços. Que pureza virginal e que limpeza de alma deveria ter alguém para receber tal privilégio!
Depois do falecimento da mãe, o santo teve que cuidar dos negócios domésticos. Enquanto isso ingressou no Oratório de São Jerônimo, que tinha os mesmos fins que a Confraria do Amor Divino, mas que incluía também socorrer os pobres. Caetano fez de tudo para elevar espiritual e materialmente os humildes trabalhadores. Conseguiu incrementar entre eles a comunhão freqüente e as visitas aos enfermos nos hospitais. Ele fundou também o Hospital dos Incuráveis para os doentes pobres sem esperança de cura.
Para levar adiante a obra da verdadeira reforma católica desejada pelos Concílios de Latrão e de Trento, São Caetano viu ser necessário começar reformando o clero. Pois grande parte deste estava contagiado pela cobiça, frivolidade, e imoralidade do Renascimento. E, se o sal não salga, torna-se inútil. Pensou então em fundar uma ordem religiosa cuja finalidade seria a de trabalhar pela reforma do clero e, por meio de um clero santo, regenerar toda a sociedade.
Caetano encontrou ótima aceitação para seu projeto entre três ilustres membros do Oratório do Amor Divino: D. João Pedro Carafa, bispo de Chietti, também oriundo de ilustre família condal; Bonifácio Cola, hábil e virtuoso advogado, e Paulo Consiglieri, também oriundo de alta sociedade, e de uma vida angelical.
Surgiu assim a Ordem dos “Teatinos”, do nome da cidade de Chieti, em latim “Theate”, da qual D. João Pedro Carafa era bispo. Carafa, nomeado depois arcebispo de Nápoles, foi fundamental na criação da Inquisição Romana, e se opôs a qualquer diálogo com o partido protestante emergente na Europa. Foi eleito papa em 1555 com o nome de Paulo IV.
Os teatinos fazem os três votos religiosos, sob a obediência de um Superior, e dependência imediata da Santa Sé.
Mas o que é mais notável nessa nova Ordem é que os teatinos deveriam ter tal confiança na Providência divina para se manterem, que não deviam possuir nada, nem pedir nada, mas viver unicamente das ofertas que os fiéis lhes oferecessem espontaneamente. Clemente VII autorizou a nova fundação.
São Caetano, em todos os lugares em que esteve, despregou contra o materialismo paganizante do Renascimento, a bandeira do sobrenaturalismo cristão, modelando sua vida e sua ação sacerdotal segundo aquela máxima evangélica que constituiu o lema de sua Ordem: “Buscai primeiro o Reino de Deus e sua justiça, e tudo vos será dado por acréscimo”.
Para isso promoveu com extraordinário zelo a magnificência do culto litúrgico, a santidade e o decoro dos templos, e a prática da Comunhão freqüente, metas importantes para sua obra de reforma. Ele teve também que lutar contra a heresia luterana que se infiltrava nos círculos aristocráticos e intelectuais de Nápoles, e denunciou mesmo ao Santo Ofício três pregadores ganhos por ela e que faziam muito mal aos fiéis. Fundou ou reformou vários mosteiros, e estabeleceu para os operários napolitanos um “Monte Pio”, que se tornou no atual Banco de Nápoles.
Ocorreu então que em 1547, D. Pedro de Toledo, vice-rei de Nápoles, que então pertencia à Espanha, movido pelo zelo pela fé, decidiu estabelecer em seus domínios o Tribunal da Inquisição nos moldes do espanhol. Isso não foi bem recebido, e a nobreza e o povo se amotinaram, o que resultou numa verdadeira guerra civil. Esse foi um fato único na história da Inquisição Espanhola.D. Pedro teve que sufocar a sedição em sangue, pois as súplicas e mediações de São Caetano foram em vão.
Como diz a bula de sua canonização, “alquebrado pela dor ao ver a Deus ofendido pelos tumultos populares, e mais ainda pela suspensão do Concílio de Trento no qual havia posto tantas esperanças, caiu enfermo de morte”, o santo ofereceu a vida para que tivesse fim as sedições, e faleceu no dia 7 de agosto de 1547. Diz ainda a bula que, no mesmo dia de sua morte, cessaram todas as revoltas populares, segundo se crê, por sua intercessão.
O Martirológio Romano diz dele neste dia: “Em Nápoles, na Campânia, São Caetano de Tiene, confessor, fundador dos Clérigos Regrantes [mais conhecidos como “teatinos”] que, por singular confiança em Deus, impôs aos seus religiosos a primitiva norma de vida apostólica. Era afamado pelos milagres que operava, e o papa Clemente X inscreveu-o entre os Santos”. São Caetano foi beatificado no dia 8 de outubro de 1629 por Urbano VIII, e canonizado em 1671 por Clemente X. Embora pouco conhecidos, outros teatinos foram também elevados à honra dos altares, como Santo André Avelino, São José Maria Tomasi, e os beatos João Marinoni e Paulo Burali de Arezzo.