Desse santo diz também o Martirológio Romano: “Em Tanger, na Mauritânia, a paixão de São Marcelo, centurião, pai dos santos mártires Cláudio, Lupércio e Vitório. Foi degolado por ordem de Agricolau, que fazia as vezes do comandante da Guarda Pretoriana. Assim se consumou seu martírio”.
A paixão de Marcelo chegou até nós em duas resenhas, transmitidas por mss. dispersos nas bibliotecas de Roma, Bruxelas, Londres, Madrid, Leão, Bordéus, etc. O núcleo original é reconhecido como autêntico, e consiste em dois relatórios de interrogatório em dois tribunais diferentes com três meses de intervalo, em dois locais diferentes. Foi por volta do século XI, que se adicionaram algumas interpolações que tornam Marcelo o marido de Santa Nona, e pai de doze filhos, Claudio, Lupercio, Vittorico, Facondo, Primitivo, Emeterio, Celidonio, Servando, Germano, Fausto, Gennaro e Marziale. A origem e evolução desta lenda, está profundamente enraizada na tradição cristã do povo de León.
Por essa legenda, São Marcelo, militar e mártir invicto da perseguição de Diocleciano, era originário da cidade de Leão, na Espanha, ou pelo menos centurião da legião Septima Gemina, lá acampada. Outros dizem que era da guarnição de Tanger, onde sofreu o martírio.
Conservam-se duas redações do seu martírio, e ambas procedem dum tronco único, que é o processo verbal. Por ele podemos ver que sua paixão é um belo exemplo de autenticidade, graças à sua prosa enxuta, essencial, e sem digressões, sem os enriquecimentos usuais na história dos primitivos cristãos.
Segundo elas, a 21 de julho de 298, se celebrava a festa dos “augustos imperadores”. Enviado a participar dos festejos do aniversário do Imperador e obrigado a lançar incenso no braseiro posto a seus pés – o que os cristãos consideravam com razão um culto idolátrico – Marcelo recusou-se a fazê-lo e, para mostrar-se coerente e, diante de toda a tropa, retirou as insígnias de centurião, jogou-a aos pés da estátua do Imperador, e se declarou cristão.
No dia 28 de julho foi interrogado pelo oficial Fortunato que, considerando a gravidade do crime, decidiu mandá-lo de volta ao seu superior, Aurelio Agricolano, de Tânger. Em 30 de outubro, Marcelo foi novamente interrogado, desta vez em Tânger, e condenado à morte.
Cassiano, um oficial chamado para redigir a ata da rebeldia, recusou-se a fazê-lo e, como Marcelo, jogou fora a pena, declarando-se também cristão.
Ambos foram aprisionados e, poucos dias depois sofreram o martírio. São Marcelo é honrado em 30 de outubro, e São Cassiano em 3 de dezembro.
A devoção que fez de Marcelo o principal patrono da cidade de Leão, no entanto, nasceu e se desenvolveu longe dos seus restos mortais, que foram preservados em Tânger. Depois, imediatamente após a libertação desta cidade, pelo rei de Portugal D. Afonso, León pediu os restos mortais de seu mártir. As cidades de Jerez e Sevilha também disputaram a posse.
Em 29 de março de 1493 porém, os restos mortais de Marcelo, trazidos pelo próprio rei Fernando, o Católico, entraram em Leão, e foram colocados na igreja a ele dedicada. De acordo com documentos contemporâneos preservados no arquivo municipal, os restos mortais receberam uma acolhida “como nunca houve melhor”.
As relíquias são mantidas hoje em uma arca de prata no altar-mor; há também um pergaminho que narra a entrada na cidade, e os milagres com que o acompanhou, os documentos relativos à doação de uma relíquia de Marcelo à igreja de S. Gil, em Sevilha, e algumas cartas do rei Henrique IV de Castela e Isabel a Católica ao Papa Sisto IV sobre a transferência do corpo do mártir para León.
As relíquias foram transportadas em procissão junto com as de São Froilano, por ocasião de grandes desastres públicos.