STF e relativismos: contribuição ao debate

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Thiago Stuchi Reis de Oliveira

A “surpresa” que a advocacia vez ou outra manifesta em relação a decisões específicas do STF, por serem contrárias à literalidade do texto constitucional, surpreende-me bem mais do que os julgamentos em si.

Constituição-1O STF tem demonstrado reiteradamente, em inúmeros casos, que a letra da Constituição nada vale em cotejo com a “minha posição”, a “minha interpretação”, o “meu entendimento”. De Suas Excelências, é claro.

A Constituição Federal é clara ao garantir que todos somos iguais perante a lei, mas o STF chancelou a implementação do pernicioso sistema de cotas para ingresso em universidades públicas.

É clara e literal ao considerar entidade familiar a união estável entre homem e mulher, mas o STF “entendeu” que também é permitida nos casos de união homossexual.

Ao tratar dos direitos e deveres do casamento, é clara ao se referir ao homem e à mulher. E desta vez o CNJ determinou por resolução (por  resolução!) às serventias extrajudiciais de todo o país que celebrem o casamento civil entre homossexuais e convertam a sua união estável em matrimônio.

É clara ao atribuir ao Estado o dever de prevenir o uso de entorpecentes, por meio de programas, mas o STF autorizou a realização da “marcha da maconha”.

É óbvia ao garantir a inviolabilidade do direito à vida, mas a Corte não hesitou em permitir o aborto de fetos anencéfalos.

supremo tribunal federalO sistema constitucional é suficientemente claro ao estabelecer as funções de cada Poder da República, mas o STF legisla a todo momento, não esqueçamos do caso Raposa Serra do Sol.

Isto é, ignorar o texto da Constituição hoje não é novidade alguma em nossa Suprema Corte.

O surpreendente deveras é que, em relação a todos os exemplos citados acima, as decisões do STF foram solenemente aplaudidas por significativa parte da população e sobretudo por notório grupo de emplumados juristas, autoproclamados defensores do progresso, arautos do avanço. Em geral os mesmos que costumam vociferar apenas contra julgamentos que, embora também contrários à Constituição, são pinçados seletivamente.

A forma com que o STF tem atuado demonstra nitidamente que a maior parte de seus membros, já há algum tempo, professa e aplica uma ideologia relativista em seus julgados, frente à qual a interpretação mais básica – literal – do texto nada vale, senão para ser desconsiderada em nome dos parâmetros fixados não pelo Poder Constituinte, mas pelos ministros de ocasião mesmo.

O relativismo que impera na Corte é tamanho que passar a ignorar a própria existência da Constituição da República faz parte do processo de interpretação do julgador, livre e imune para abstrair da realidade, tudo na forma de “opinião”.

E infinitos são os meios para se aplicar o método, moleza que é se esconder no direito constitucional tabajara em voga no país, do qual o chamado sopesamento de princípios, que aceita quase tudo, é uma das ferramentas mais requisitadas.

Nestas breves considerações não há espaço para que sejam identificados todos os objetivos nefastos por trás da relativização, o que no entanto será objeto de outro artigo, oportunamente.

Mas desde já: o que esses agentes, juízes inclusive, vislumbram é instalar o caos na sociedade, que aos poucos perde o norte, não enxerga mais referência – seja a Constituição, a moral – em que se apoiar. A constante mudança dos parâmetros em jogo é a consolidação da própria ausência de parâmetros. Daí, o terreno para uma revolução está preparado e adubado…

A histeria meia bomba relacionada à transgressão do texto constitucional em uma ou outra decisão, somente, será sempre inócua. As críticas ganharão consistência apenas se forem ampliadas ao modo de julgar a que o STF se acostumou, em qualquer caso. Para quem está revestido de franqueza no questionamento, o que se deve evitar a todo custo é a sua seletividade. É a forma lógica e coerente de encarar o problema, no intuito sincero de combatê-lo.

Do contrário, apartando de graça a má-fé de quem critica o micro ao mesmo tempo em que promove e sustenta o macro, resta apenas hipocrisia, na hipótese mais branda: tão relativista quanto a Corte não é a própria postura camaleônica de amoldar as críticas apenas ao que interessa ao indivíduo e ao grupo ideológico de que faz parte?


Thiago Stuchi Reis de Oliveira é Advogado em Alta Floresta-MT

 

3 COMENTÁRIOS

  1. Acho o artigo extremamente útil e muito bom
    Útil, porque nos faz ver que a nossa Corte Supremo julga ao sabor dos interesses momentâneos de que tem voz e poder. E isso é o piro que pode acontecer a um país. Deixar de ter normas que nos guiem no vida
    Bom, porque alancou uma série de casos que nos mostram como é verdade que a jurisprudência no nosso país gira conforme os ventos sopram.

    Estamos no caos da justiça

  2. Afinal no meio de tantas trevas e hipocrisia, aparece uma réstia de luz neste artigo do Dr. Thiago Stuchi. – Eu não sou advogado mas, li e entendi tão extraordinário esclarecimento ! Que surjam nos meios advocatícios outros heróis capazes de dizer toda verdade sobre a Constituição e o Direito. O Brasil só tem a ganhar … Espero com avides o próximo artigo deste ilustre esclarecedor jurídico.

    • Infelizmente, Garcia, não vejo com otimismo o futuro do meio jurídico nacional. O relativismo, como exemplarmente explanado no brilhante texto do caro colega, já é uma realidade há muito consolidada na cultura “jurídica” brasileira. Há muito este importantíssimo campo profissional foi tomado pela ideologia de esquerda, mais especificamente o gramscismo. Todo e qualquer “entendimento” de cunho pseudo jurídico que venha carregado de ideologismo gramscista tem ampla aceitação, em grande parte pela ditadura politicamente correta, outra poderosa ferramenta de aprisionamento através da já bem conhecida espiral do silêncio. Sendo assim, toda “interpretação” que apele ao vitimismo de “minorias” será acolhido com glórias, ainda que afronte vergonhosamente nossa Constituição. Aliás, aproveito para assinalar que vivemos num país atualmente sem constituição alguma, ao menos na prática, pois o PT e seus asseclas podem tudo, fazem o que bem entendem já há bastante tempo e nenhuma consequência sofrem. Recentemente, li um texto chamado “dossiê ursal” (http://www.dossieursal.com/) e, se vivêssemos num país saudável institucionalmente falando, com apenas um centésimo dos fatos ali expostos, Lula teria sido impichado e hoje estaria preso, o PT não existiria mais, e Dilma nem sequer teria concorrido a eleição alguma. Mas infelizmente vivemos numa pátria tomada pelo bolivarianismo e pelas garras do Foro de São Paulo. Só nos resta torcer e rezar para que haja intervenção militar, pois a considerar o nível de aparelhamento e de corrupção, as instituições apenas aparentam funcionar corretamente, enquanto os “donos da situação” riem da nossa cara por trás dos bastidores.

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