Neste dia 25 de agosto completa-se exatamente 750 anos da morte de São Luís IX, o santo e heróico Rei da França. “Espelho de reis, esforçado capitão, exemplaríssimo esposo, reto e prudente no administrar a justiça, verdadeiro pai de seu povo e, por isto, honra e ornamento da coroa da França, e glória de toda a Igreja”.1 Em sua memória reproduzimos neste espaço uma matéria publicada na revista Catolicismo.
São Luís — Monarca exemplar nos anais da Cristandade
“Cabe a este insigne varão e valoroso príncipe a glória de ter conseguido ser santo em meio aos esplendores da corte, na família, à cabeça dos exércitos, e entre os múltiplos cuidados inerentes ao bom governo de um grande e poderoso reino. […] Pérola dos soberanos, glória da coroa da França, modelo de todos os príncipes cristãos e, para dizer em apenas três palavras, um monarca verdadeiramente segundo o coração de Deus, segundo o coração da Igreja, e segundo o coração do povo”.2
São Luís de França nasceu no dia 25 de abril de 1215, filho de Luís VIII e de Branca de Castela, neta, filha, esposa, irmã e mãe de reis. “Luís encontrou nela a mestra mais experimentada na virtude e no governo. Regente da França à morte de seu marido quando seu filho tinha somente nove anos, deu provas de uma energia indomável. Foi vista comandando os exércitos com toda a bravura dos grandes capitães, e governando o reino com todas as virtudes de um homem de Estado. Mulher ativa e enérgica, rainha severa e justa, tudo queria fazer por suas mãos, e nada lhe parecia difícil quando se tratava de manter a majestade da coroa de seu filho”.3
Rei aos 12 anos sob a tutela da mãe
A prudente rainha cercou seu filho dos mais idôneos tutores, procurando imprimir nele o ódio ao pecado e o amor à virtude. Dizia-lhe constantemente: “Meu filho, eu preferiria mais ver-te no túmulo, a ser manchado por um só pecado mortal”.
Luís subiu ao trono com apenas 12 anos, sob a tutela de Branca. Durante sua minoridade, a enérgica rainha reprimiu diversas guerras, governando o reino com sabedoria e justiça.
Tomando sobre si as rédeas do governo aos 20 anos, Luís casou-se com Margarida, filha mais velha de Raimundo Berenger, conde da Provença. A nova rainha tinha as mesmas inclinações de seu esposo para a piedade e o socorro dos pobres e infelizes. Muito discreta, Margarida jamais se imiscuía nos negócios do marido, a não ser quando chamada. Seguiu o rei por toda parte, mesmo além-mar. Tiveram 11 filhos, seis varões e cinco mulheres que, com exceção da primeira, também se tornaram rainhas.
“São Luís foi sempre muito querido e estimado por sua encantadora mansidão, por seu arrojo e valor nos perigos, equanimidade inalterável, grande amor à justiça e, acima de tudo, por sua admirável piedade e terna devoção. Todos os dias ele rezava ou fazia rezar pelos religiosos de São Domingos ou de São Francisco as horas canônicas. Durante toda sua vida manteve-se fiel a esta prática, sem que as viagens nem as muitas expedições guerreiras que empreendeu, nem mesmo as enfermidades, fossem motivo para permitir-se dispensar-se dela”.4
Juiz da Europa
Governando bem sua casa, Luís IX era ainda mais admirável no governo de seu Estado. Jamais se viu tanta paz e prosperidade na França quanto durante seu longo reinado de 36 anos. “Todas as outras nações, no Oriente e no Ocidente, do sul ao norte, estavam com problemas; mas os franceses, sob seu governo, gozavam de uma feliz tranquilidade, que lhes era dada por sua sabedoria”.5 Ele baniu de seus Estados a blasfêmia e os juramentos ímpios e execratórios, proibiu os duelos, os jogos de azar, a frequência aos lugares de deboche e as chicanas nos processos.
Tal era seu espírito de justiça e desinteresse, que em 1264 o rei da Inglaterra foi a Amiens com os grandes de seu reino, para que o santo resolvesse seus pleitos. São Luís foi também árbitro nas desavenças entre o duque de Bretanha e o rei da Navarra.
Para o bom governo do reino, o monarca santo cercava-se de eminentes teólogos como Santo Tomás de Aquino, São Boaventura, Guido Foucaud e Simão de Brion, que foram depois os Papas Clemente IV e Martinho IV, bem como do insigne teólogo, Roberto Sorbon, que instituiu em Paris o famoso colégio da Sorbonne.
Sua primeira Cruzada
Luís IX resolveu partir para a Terra Santa no fim do ano de 1244, após séria doença. Não se sabe o que se passou no dia inteiro em que ele esteve quase morto. O fato é que, quando se recuperou, julgou-se obrigado, como por sagrado juramento, a empreender a Cruzada.
Os príncipes, irmãos do rei — Roberto, conde d’Artois, Afonso, conde de Poitiers e Carlos, conde de Anjou — bem como os maiores senhores do reino, receberam com ele a cruz dos cruzados. Sua esposa Margarida e os filhos pequenos, as cunhadas, esposas de seus irmãos, também quiseram acompanhá-los.
A partida se deu no dia 25 de agosto de 1248, desembarcando na ilha de Chipre, escolhida como centro das expedições militares.
Início promissor
Obrigado a permanecer durante todo o inverno em Chipre por causa da peste, que dizimou a sexta parte de seu exército, e também porque seu irmão Afonso ainda não havia chegado com o resto do exército, o rei reiniciou finalmente em 13 de maio de 1249 sua viagem rumo ao Egito, com apenas 700 cavaleiros dos dois mil e setecentos que formavam seu exército.
Ele havia julgado necessário primeiro a conquista daquele país, para poder aliviar a Terra Santa. Por isso assaltou o porto de Damieta, atacando com galhardia os infiéis. Os cruzados tiveram que enfrentar seis mil sarracenos. Mas a fúria com que investiram foi tal, que os islamitas fugiram em debandada, abandonando a cidade. O rei mandou cantar o Te Deum e purificar a mesquita principal, para consagrá-la a Nossa Senhora.
O indômito guerreiro queria ir atrás dos inimigos em fuga, mas preferiu seguir a opinião do seu Conselho, que optou por esperar a chegada de reforços dos barcos dissipados pela tormenta, e do príncipe Afonso com o resto das tropas.
“Jamais vi cavaleiro tão formoso”
Chegados os reforços, os cruzados conseguiram obter grande vitória em Mansurah, em 1250. Joinville, senescal da Champagne (oficial real encarregado da aplicação da justiça e do controle da administração nas províncias do sul do país), entusiasmado com a figura do rei durante essa batalha, afirmou: “Vi chegar o rei à frente da cavalaria. Sua cabeça sobressaía acima dos ombros de todos. Levava um capacete dourado, brandia uma espada da Alemanha: suas armas deslumbravam os olhos, e seu porte majestoso alentava os guerreiros. Asseguro-vos que jamais vi cavaleiro tão formoso”.6 Com seus possantes braços, o rei dava tantos golpes de espada e de massa, que derrubava todos os que dele se aproximavam.
Ócio dos soldados e débâcle
“No entanto, a abundância do país e a preguiça de nossos soldados introduziram logo a dissolução e o deboche no exército. Os soldados, e até mesmo muitos dos senhores, entregaram-se aos crimes e às abominações dos bárbaros que tinham exterminado. Dissipavam, pelo jogo e pelas festas contínuas, o que devia servir para sustentá-los num país tão afastado”.7
Isso atraiu a cólera de Deus. Uma epidemia obrigou os vencedores a retroceder. Essa retirada foi desastrosa para os cristãos que, adoentados, se viram envoltos totalmente por seus inimigos e feitos prisioneiros, inclusive o rei. O único meio de livrar-se da morte era rendendo-se.
O rei, “enfermo, e só com um criado para atendê-lo em tão angustiosa situação, nunca dirigiu uma súplica a seus inimigos, nem sua altivez se humilhou à linguagem da submissão e do medo. […] Os infiéis estavam assombrados vendo tanta resignação, e diziam entre si que abandonariam sua fé se algum dia o profeta os deixasse expostos a tantas calamidades”.8
Atingido pela peste e muito fraco, Luís IX declarou que se renderia com todo o seu exército, contanto que lhes deixassem a vida, prometendo também pagar um milhão de pesos de ouro para libertar seus soldados. E, para seu próprio resgate, devolveria a cidade de Damieta aos infiéis, o que foi aceito.
Retorno à França
Com isso, vendo-se livre, o desejo do rei era voltar imediatamente para a França com a rainha, seus filhos e os príncipes. Entretanto, considerando que os sarracenos tinham rompido a trégua e violado seus juramentos, não quis partir, pois se o fizesse deixaria os cristãos expostos à ira dos infiéis. Por isso permaneceu em Acre, resgatando cristãos, socorrendo os pobres, exercendo a justiça, reedificando igrejas e fazendo bem a todos.
Foi quando recebeu a notícia de que a rainha Branca havia falecido, aos 65 anos de idade, em 1252. Foi um choque para o rei, que exclamou: “Eu a amei seguramente acima de todas as criaturas mortais, como ela bem merecia que eu tivesse por ela essa afeição e ternura. Entretanto, uma vez que Vós, meu Deus, haveis julgado por bem levá-la para Vós, que vosso santo Nome seja louvado e bendito eternamente!”.9
Segunda Cruzada
Para júbilo geral, o santo voltou à França. Entretanto, tinha sempre presente o que se passava no Oriente, em particular a opressão em que havia deixado seus cavaleiros, que lhe imploravam por socorro. Isso o levou a empreender uma segunda cruzada. Acompanharam-no a rainha e três filhos.
São Luís tinha a esperança de converter o rei de Túnis, que havia mostrado alguma abertura para isso.
Mas tudo não passava de fingimento. O sultão defendeu-se com unhas e dentes, e os cruzados conseguiram apenas conquistar um terreno próximo das ruínas de Cartago. De lá assaltaram a capital, fortemente defendida. Querendo rendê-la pela fome, cercaram-na, impedindo a chegada de víveres.
Entretanto, também eles foram vítimas da escassez de alimentos, de nova peste provocada pelos cadáveres em corrupção, e pela disenteria, que pôs o exército fora de combate. O legado do Papa sucumbiu, assim como um dos filhos do rei. Ele próprio foi atacado por uma febre contínua, com fluxo de sangue. Logo a trágica notícia abalou todo o acampamento: “O rei está morrendo!”.
São Luís chamou os principais oficiais de seu exército para junto de si, e os exortou a se comportarem como verdadeiros servidores de Jesus Cristo: “Porquanto vós sois seus soldados não somente pelo Batismo, mas também pela cruz que tomastes com tanta generosidade, não vivais como seus inimigos, não Lhe façais guerra por vossa impiedade, avareza, gula e impudicícia; uma vez que sustentais seu Nome pela força de vossas armas, não sejais maometanos pelos vossos comportamentos, tendo feito uma profissão tão autêntica de serdes cristãos, expondo vossas vidas por sua Igreja”.10
As palavras que deixou a seu filho e sucessor — as quais a escassez de espaço infelizmente não nos permite citar — são um portento de sabedoria e santidade.
O heroico e santo rei rendeu a Deus sua ilibada alma no dia 25 de agosto de 1270, aos 56 anos de idade.
Epílogo
São Luís, entretanto, continuava sua luta do Céu. Com efeito, poucos dias após o seu falecimento, seu irmão Carlos, rei da Sicília, chegava a Túnis com formidável exército, que se juntou aos soldados remanescentes deixados pelo Santo. Eles se arremessaram de tal maneira contra os infiéis, que estes foram obrigados a pedir a paz. As condições impostas foram duras para os mouros, e muito vantajosas para a Cristandade: liberdade de todos os cristãos cativos, permissão para que os religiosos de São Domingos e de São Francisco pudessem lá pregar a religião verdadeira, batizando todos os que se convertessem à verdadeira fé, além de pesado resgate. “De maneira que podemos dizer que o rei morto venceu os mouros, e que a armada, por suas orações, mereceu a vitória e feliz sucesso que o Senhor lhe concedeu”.11
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Notas:
- Edelvives, El Santo de Cada Día, Editorial Luis Vives, S.A., Saragoza, 1948, tomo IV, p. 562.
- Mgr Paul Guérin, Les Petits Bollandistes, Paris, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, 1882, tomo X, p. 192.
- Fr. Justo Pérez de Urbel, O.S.B., Año Cristiano, Ediciones Fax, Madrid, 1945, tomo III, p. 434.
- Id.ib.
- Bollandistes, p. 197.
- Urbel, p. 444.
- Bolandistes, , p. 205.
- Id. p. 443.
- Bollandistes, p. 208.
- Id. p. 215.
- Pe. Pedro de Ribadeneira, S.J., Flos Sanctorum, in Pe. Eduardo Maria Vilarrasa, La Leyenda de Oro, L. González y Compañia – Editores, Barcelona, 1897, tomo III, p. 391.