Com estas lúcidas palavras em epígrafe o Secretário de desestatização do governo federal, Salim Mattar, definiu bem a situação de uma das maiores mineradoras do mundo: a Vale do Rio Doce. Com efeito, ela foi privatizada no governo Fernando Henrique, mas ficou sempre tutelada pelos governos do PT, sobretudo na gestão Dilma.
Na ocasião, Rousseff retirou da presidência da empresa o Sr. Rogério Agnelli, morto num desastre de avião, ainda não totalmente esclarecido, para colocar em seu lugar o Sr. Murilo Ferreira, sob a gestão de quem ocorreu a tragédia do rompimento da barragem de Mariana.
Até a insuspeita Miriam Leitão criticou Murilo Ferreira, que a cada aparecimento público se evanescia pela inépcia ao lidar com o problema das sequelas da barragem rompida. Ele acabou saindo sem prestígio e com os bolsos cheios de milhões de reais dados pela empresa, pelo fim antecipado do contrato.
Para o seu lugar foi indicado o sindicalista Fábio Schwartzman que afirmou, diante dos senadores, que a Vale não poderia ser condenada por se tratar da joia da coroa, uma das maiores empresas brasileiras, pagadora de impostos, além de trazer divisas com exportações. De fato, a empresa deve indenizar as vítimas, mas a responsabilidade sobre o desastre cabe aos seus diretores, devendo responder processos e, no caso de condenados, punidos exemplarmente.
Conto isso para que o problema fique bem focalizado e, assim, poder entrar na acusação de que a Vale fora convertida num “paquiderme estatal”, amarrada à burocracia amalucada que vigorava no País até há pouco.
Não posso deixar de mais uma vez citar as considerações coerentes e práticas do Dr. Thiago de Andrade Lima, fundamentadas em pesquisas desenvolvidas em 2015 pelo laboratório da Universidade Federal de Minas Gerais, para transformar rejeitos de mineradoras em insumo para construção civil (“Valor” 14-12-2019), chegando a exibir um vídeo de residências construídas com tais resíduos.
O jornal “Estado de São Paulo” de 26 de maio do corrente, sob o título “como esvaziar barragens e fazer cimento” publicou viva reportagem de Giovana Girardi, deixando claro como transforma um problema em solução!
A tecnologia só foi desenvolvida pelo laboratório de geotecnologia e geomateriais do Centro de Produção Sustentável da Universidade Federal de Minas Gerais, em Pedro Leopoldo, a cargo do pesquisador Evandro Moraes da Gama.
Diz a repórter: “A pesquisa experimental conseguiu transformar o rejeito em uma espécie de cimento — pozolana — em areia e em pigmento. Os produtos já se mostraram úteis como base de concreto, argamassa e pelotas de minério e pode ser aplicado na construção civil, na pavimentação de estradas e também na agricultura”.
O pesquisador Moraes da Gama explica que “tudo o que estiver na barragem de minérios pode virar produto. A proposta é termos um sistema sustentável completo na cadeia de mineração. Isto é técnica e economicamente viável”.
Continua a jornalista: Na fábrica experimental é possível ver tijolos, lajotas, pisos e blocos, além do produto base a pozolana, pó semelhante ao cimento e tem a vantagem de ser colorido, de acordo com as características do minério: vermelho, alaranjado, ocre e marrom.
No local há uma casa vermelha de 46 m2 feita com este material, cujo custo é equivalente a um terço de uma casa do mesmo tamanho construída com materiais de construção convencionais. Quem sabe a Vale criar o slogan: “Transforme a ‘morte’ em minha casa, minha vida”.
A matéria de Giovanna Girardi confirma o que já havíamos dito em artigo de maio passado, ou seja, de que tal processamento não precisa ser feito diretamente pela Vale, pois bastaria estabelecer parcerias com ceramistas. Lembramos que os industriais deveriam ter um incentivo do governo como ocorre em outros países. Aliás, o porcelanato chinês que compramos no Brasil é feito com resíduo de minério.
O projeto começou há quatro anos e teve financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – FAPEMIG, recursos da Vale e da Samarco, sócias da parte. Conclusão: “Só não fazem esse aproveitamento porque não querem, dizem que o estatuto social não permite fazer outra coisa que não ferro”.
Ao que parece, alguns dirigentes da Vale têm a cabeça de tecnocratas muitas vezes bitolados, o que acontece com quase a totalidade dos especialistas, ou seja, saberem muito do pouco e pouco do muito… Um diretor da Vale que chega a dizer que a Vale só sabe mexer com ferro, torna-se surdo à opinião pública brasileira e mundial.
Até do ponto de vista dos investidores, a Vale fica prejudicada, pois ninguém investe numa empresa que esquece a dimensão social de seu trabalho, relegando-o a um plano secundário, comprometendo centenas de vidas humanas. Em razão disso, a Vale perdeu R$ 19 bilhões, com prejuízos causados pelo rompimento, indenizações, estancamento na produção, entre outros.
Se seu estatuto está errado ou incorreto, que o mudem ou o adaptem; terceirizem aos ceramistas que saberão aproveitar os rejeitos. Caso contrário, vai continuar matando pessoas, poluindo o ambiente e levando prejuízos bilionários.
A reportagem ressalta que 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos das barragens da Vale alcançariam pavimentar até 4.200 km de estradas, ou seja, quase a distância entre Manaus e Curitiba. Quantas ruas e avenidas poderiam ser pavimentadas com esse produto reutilizável?
Moraes da Gama — que durante a sua carreira ajudou a projetar barragens — diz que elas hoje não fazem mais sentido: “Isso ajudaria a Vale. Vai desobstruir a área dela, de qualquer modo eles terão de tirar esses rejeitos. Vai fazer o que com eles? Mandar para a lua?”
Procurada por jornalistas, tecnocratas da Vale responderam ter já apresentado às autoridades competentes um plano de descaracterização de suas barragens de alteamento, sendo que os rejeitos já são recuperados e incorporados à produção mineral. Por favor, façam antes as vítimas falarem, pelo menos as que sobreviveram, pois muitas se calaram para sempre…
No dia 23-6-19.no mesmo “Estado de São Paulo”, reportagem de Irani Teresa informa que a empresa está buscando soluções alternativas para as barragens, pelo beneficiamento do minério de ferro sem uso da água. Trata-se de tecnologia utilizada em pequena escala e que pode não dar resultado.
Essa reportagem cita o consultor João Carlos Martins, da Neelix Consulting Metals& Mining: “Não é uma solução simples. Embora exista tecnologia para processamento a seco, o processo é para pequena escala. Para as grandes ainda não existe uma tecnologia aprovada”.
“Outra questão importante é que não há como eliminar o rejeito que deverá ser transportado por caminhões, e que não pode ser muito distante da mina, caso contrário o custo fica proibitivo. Então, o processamento a seco elimina as barragens, mas não elimina os rejeitos. Vejo isso como trocar seis por meia dúzia”.
Teimosa, a Vale pagou 500 milhões de dólares pela empresa New Steel que está fazendo os testes para produzir o minério sem água, mas pode demorar de 5 a 10 anos… O jornal “Valor” (14-5-19), afirma que a Vale investirá R$ 11 bilhões na produção a seco, apesar de o grande problema ser a produção em escala, ou seja, a tese há pouco mencionada.
É novamente a incompetência ‘paraestatal’ com a solução já aprovada por especialistas, isto é, a terceirização para empresas privadas fazerem pó da pozolana e vendê-lo aos ceramistas como matéria-prima para blocos, tijolos e pavimentação.
Podemos dar como certo que não faltarão compradores do precioso insumo nesta hora em que as normas ambientais draconianas criam todos os tipos de obstáculos para a obtenção da argila para confecção de tijolos, cerâmica, telhas etc.
Há poucos dias saiu mais uma notícia negativa para a empresa, de um navio da Vale, adaptação de um petroleiro, ter sido utilizado para transportar ferro, o que não condizia com a estrutura adequada de um barco de transporte de minério líquido. Este barco com 260 mil toneladas de pelotas sólidas de ferro afundou em março 2015, a 1.700 milhas da costa uruguaia.
A pergunta que fica no ar: — Por que essa tragédia só foi noticiada alguns anos depois!? Que Deus e nossa padroeira de Aparecida ajudem a dar luzes aos novos governantes para que destravem o Brasil da maldição estatizante e burocrática.
Em tempo: até o fechamento do presente artigo, nenhum diretor ou funcionário da Vale foi condenado ou preso…