Advertências necessárias e oportunas

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Tempos atrás o empresário Salim Mattar [foto] demitiu-se da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados. Compreensivelmente, foi enorme o desconcerto, em especial no mercado. Todos sabem, pela sua trajetória era o maior símbolo, junto com o ministro Paulo Guedes, da obediência do governo ao programa enunciado na campanha de apoio à propriedade privada, livre iniciativa e desestatização. Menos governo, menos Estado, mais sociedade civil, objetivos expressos de algum modo no slogan “Menos Brasília, mais Brasil”.

Salim Mattar deixou o governo, mas não bateu a porta, nem saiu atirando. Homem de grandes responsabilidades familiares, empresariais e defensor há décadas dos princípios do liberalismo econômico, esteve à altura da ocasião com comportamento discreto, firme e educado. Com isso, preservou posições, a partir das quais pode continuar a ser voz ouvida nos debates nacionais. Mas o empresário oliveirense percebeu que o mercado e em especial a opinião nacional dele esperavam palavras de esclarecimento. Não podia simplesmente pedir o chapéu e sair calado. E o fez particularmente em artigo prudentemente revelador intitulado “Por que saí do Governo”. Está na rede. Deixa claro na matéria: “Continuo apoiando a pauta econômica do ministro Paulo Guedes e também do governo Bolsonaro”.

Vale a leitura. O mais importante do texto densamente informativo são as advertências. Salim Mattar disse a verdade, mas a prudência guiou a pena e a fez parcimoniosa. O leitor, contudo, com base no que escreveu, caminhando por conta própria, levado por lógica incoercível, pode compor quadro verossímil, bem fundamentado, de um importante bloco de problemas brasileiros. É o que, em parte, procurarei fazer aqui.

Vamos às advertências: “A lógica do governo não é a lógica da iniciativa privada”. Não fala em tese, refere-se aqui ao governo no Brasil; óbvio, não tem em vista o governo nos Estados Unidos, em que outro é o ritmo, animado por lógica diferente. Continua: “São mundos absolutamente distintos, mundos que deveriam se complementar, mas, ao contrário, competem entre si”. Precisa bem, o ideal seria complementaridade, o que existe é concorrência. São adversários. O saudável, digo na esteira de Salim Mattar, seria a obediência ao princípio de subsidiariedade em que o Estado, atuando supletivamente, complementasse o que a sociedade, família e grupos intermediários, não pudesse realizar. Não é o que observou entristecido e desgostado o Dr. Mattar. Uma casta (ele vai discorrer a respeito) faz do Estado na prática, o adversário da sociedade, de onde suga o nutrimento. É uma disputa destrutiva, prejudicial ao Brasil.

Prossegue o empresário em explicação didática: “Se no mundo dos negócios a orientação é mudar para melhorar, no governo é permanecer as coisas como são para manter do jeito que estão”. Mattar aponta descalabro de emperramento, geradora de retrocesso. Por causa de uma burocracia incrustada na administração pública, o Brasil permanece emperrado, vítima de imobilismo parasitário, situação profundamente antissocial.

Constata de forma surpreendente: “Os liberais ‘de fora’ que vieram para o governo cabem num micro-ônibus”. De outro modo, tal minoria ínfima procura dar ao Brasil um rumo, rejeitado por ambiente dominado por intervencionistas e estatistas. Mattar viu-se diante de um mastodôntico mundo oficial cevado e viciado no estatismo, que vive bem no meio da incompetência, roubalheira e desleixo próprios às sociedades coletivistas. E agora não surpreende a conclusão: “A tese liberal de reduzir o tamanho do Estado para desonerar o cidadão é aplaudida, mas pouco apoiada”. Com isso, recursos dilapidados. De outro modo, aplausos quase tão-somente para a galeria, atendendo a uma opinião pública de tendência conservadora, mas à vera ação governamental em sentido contrário, de enrijecimento do estatismo. Tal fato se reflete nas dificuldades legais para transferir empresas para o setor privado: “O arcabouço legal do processo de desestatização é complexo e moroso. São quinze agentes envolvidos, do presidente ao ministro setorial, do TCU ao BNDES. Tudo torna o processo burocrático, lento”.

O líder empresarial enumera então o que chama de Establishment, ou seja, grupos e pessoas formal ou informalmente articulados para a defesa e promoção de determinado estado de coisas: “O Establishment composto diretamente pelos empregados públicos, sindicatos, fornecedores, comunidades, políticos locais, partidos de esquerda e lideranças políticas” trabalha pelo triunfo do estatismo e dificulta a privatização. São a vanguarda do atraso, responsáveis diretos pela paradeira econômica, crueldade em especial em relação aos pobres. Chamo a atenção para alguns dos responsáveis apontados pelo Dr. Salim: os partidos de esquerda, em primeiro lugar. Em segundo, fornecedores, isto é, empresas que trabalham para o setor público. A elas interessa o ambiente de laxismo, propinas, roubalheiras e lucros fáceis. O mensalão, o petróleo o provam. E se impede a revelação do “elotrolão”, que mostraria a mesma realidade. Finalmente, políticos de várias orientações, que vivem de indicar apaniguados para estatais, de onde tiram o financiamento para as campanhas e, por vezes, algum para o bolso.

Ainda sobre as estatais, informa ele: “As estatais que sobrevivem com subvenções e aportes da União totalizaram um rombo de R$190 bilhões nos últimos 10 anos, dinheiro suficiente para se construir e doar 1,9 milhões de casas populares”. Não é vender as casas a juros subvencionados, vejam bem, é dar de graça. Seria muito mais útil socialmente do que torrar a dinheirama em estatais perdulárias. Também informa que enganosamente foi informado que o Brasil (só o governo federal) tinha 134 estatais, o que já seria um disparate: “Iniciamos uma análise mais detida e encontramos 698 empresas. O Estado-empresário é gigantesco e não quer ser amputado”. A isso se devem somar as estatais dos poderes estaduais e municipais.

Ainda pipocam outras advertências no texto de Salim Mattar. Vão na mesma direção do que acima foi mencionado. Explica, por fim, o motivo determinante de sua saída: “Deixei o governo porque, em minha análise de esforço despendido versus resultados, a conta foi negativa. Dedicando meu tempo aos institutos liberais Brasil afora, posso continuar contribuindo para a construção de um país melhor, com menos Estado, menos oneroso para o cidadão e menor interferência na vida privada”. Boa sorte ao Dr. Salim, que Deus o proteja.

1 COMENTÁRIO

  1. Um artigo como o presente, teria sido muito mais útil para o encaminhamento da resolução das dores do povo brasileiro do que o blábláblá dessa CF/21 da CNBB. Sem dúvida, a retirada do estamento burocrático de perto das tetas suculentas da porca grande, deverá ser sempre o primeiro passo a ser dado para a eliminação gradual da escorchante carga tributária que tanto penaliza a nossa gente.

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