Em seu livro “Diálogos”, em que narra a vida de Santos, o papa São Gregório Magno dedica o capítulo II a São Bento. Assim principia ele:
“Houve um homem de vida venerável pela graça e pelo nome, Bento, que desde sua infância teve a cordura de um ancião. Com efeito, adiantando-se pelos seus costumes à idade, não entregou seu espírito a prazer sensual algum, senão que, estando ainda nesta Terra e podendo gozar livremente das coisas temporais, desprezou o mundo com suas flores, como se estivessem murchas”.
Bento era oriundo da nobre família Anicia, que dera a Roma cônsules e imperadores, e nasceu no povoado de Sabino, em Núrcia, na Umbria, por volta de 480. Quatro anos antes, Odoacro, chefe de um exército de mercenários germânicos de estirpe hérula, destituía o último imperador romano do Ocidente, fazendo cessar assim o domínio que tinha Roma sobre todo o mundo civilizado de então.
Bento tinha uma irmã gêmea, Escolástica, da qual sabe-se que foi consagrada a Deus desde a infância, mas não se tem mais pormenores de sua vida, a não ser de sua morte.
Acompanhado de sua ama de leite, Bento foi enviado a Roma para estudar. Acontece que, aos poucos, ele viu que, nas escolas e nos colégios, os jovens imitavam os vícios de seus maiores. Por isso o adolescente, desgostoso, retirou-se – ainda com sua ama de leite –, para a cidadezinha de Efide onde, auxiliado “por muitos homens honrados” instalou-se perto da igreja de São Pedro.
Foi nesse pequeno lugar que Bento operou o primeiro milagre de que se tem notícia, reconstituindo por sua oração, um jarro quebrado por sua ama. A fama do milagre espalhou-se pela cidade, e era exatamente o que o santo não queria. Por isso, resolveu retirar-se para um lugar inteiramente isolado, onde pudesse estar a sós com Deus.
Desta vez, sem levar consigo a ama, foi para uma região agreste, montanhosa, a umas quatro milhas de Roma, chamada Subiaco. Lá encontrou um monge, Romão, que sabendo de seus desígnios, deu-lhe um hábito de eremita, e indicou-lhe uma gruta tão inacessível, que dificilmente alguém poderia encontrá-lo. E o mesmo São Romão fazia descer o pão para seu alimento por uma cordinha, à qual amarrara uma sineta. Nesse recolhimento total, o solitário viveu durante três anos.
Ocorreu então que alguns pastores descobriram o solitário. Este lhes falou das verdades da religião e, aos poucos, a fama de santidade de Bento irradiou-se pela região.
Havia nas proximidades de Subiaco um mosteiro cujos monges tinham decaído em seu primitivo fervor. Falecendo seu abade, eles escolheram Bento para substituí-lo. Para o bem da paz, o santo acabou cedendo. Mas os monges não puderam suportar suas contínuas admoestações, seus conselhos, e sobretudo a força de seu exemplo. Aqueles tresloucados resolveram então envenená-lo. Para isso deram-lhe uma taça de vinho, na qual haviam derramado substância fortemente venenosa. Antes de beber Bento, como era seu costume, fez o Sinal da Cruz na taça, e ela despedaçou-se em suas mãos. Bento voltou então para sua amada solidão de Subiaco
A fama do solitário continuou a se espraiar como mancha de azeite, e gente de toda condição acorria para consultá-lo ou ouvir-lhe palavras de vida eterna. Alguns iam mais longe: o nobre Euquício confiou seu filho Mauro, de apenas 12 anos, para que Bento o educasse e dirigisse. E o patrício Tértulo fez o mesmo com seu filho Plácido, então com 7 anos. Na escola de Bento ambos chegaram à honra dos altares.
Aos poucos, doze conventos espalharam-se ao redor de Subiaco, cada um com doze monges e um superior, tendo Bento a supervisão de todos eles.
Vendo o bem que Bento fazia, e consentindo numa tentação do demônio, Florêncio, um sacerdote que morava nas proximidades, por inveja encheu-se de ódio pelo Santo. Tentou então matá-lo enviando-lhe um pão envenenado. Mas São Bento, conhecendo o fato por revelação, ordenou a um corvo que levasse o pão para um lugar onde não pudesse causar dano a ninguém.
Sabendo ele que era o único objeto dessa e de outras ofensivas, resolveu retirar-se, levando consigo apenas alguns discípulos. Chegou então à região do Monte Cassino, onde havia as ruínas de uma cidade romana na qual haviam venerado o deus pagão Apolo. No lugar plantou uma cruz, e começou a construção do mosteiro que tanta fama adquiriria no mundo do tempo.
Querendo que seus monges unissem a vida ativa à contemplativa no Ora et Labora (reza e trabalha), São Bento escreveu sua Regra, obra mestra destinada à perpetuidade. Ela é, de acordo com o famoso pregador francês Bossuet, uma “suma do cristianismo, resumo douto e misterioso de toda a doutrina do Evangelho, das instituições dos Santos Padres, de todos os conselhos de perfeição, na qual se alcança, no seu cimo mais alto, a prudência e a simplicidade, a humildade e o valor, a severidade e a doçura, a liberdade e a dependência: na qual a correção tem toda sua firmeza, a condescendência todo seu encanto, a voz de mando todo seu vigor, a sujeição todo seu repouso, o silêncio sua gravidade, a palavra sua graça, a força seu exercício, e a debilidade seu apoio”.
São Bento faleceu em 21 de março de 543. Dele diz o Martirológio Romano: “Em Monte Cassino, o natalício [para o céu] de São Bento, abade, que restaurou e propagou maravilhosamente a disciplina monástica no Ocidente, quase inteiramente decaída. O bem-aventurado Gregório descreveu-lhe a vida, que é gloriosa pelas virtudes e milagres”.