O historiador e teólogo Tirânio Rufino, ou Rufino de Aquiléia (entre 340 e 345 – 410), quando esteve em Alexandria, ter-se-ia encontrado com um jovem chamado Frumêncio, que lhe teria narrado sua aventurosa história. Ou, segundo outra versão, foi seu irmão Edésio que, estando em Tiro no atual Líbano, teria encontrado Rufino, que também lá estava, e lhe teria contado o que sucedera com os dois irmãos.
Seja como for, pouco depois o historiador e teólogo Teodoreto, (393-entre 458 e 466), bispo de Cirro na Síria, provavelmente com base no relato de Rufino, narra essa história que serve de base a quase todas as biografias de São Frumêncio.
Em linhas gerais ocorreu o seguinte: Um cidadão de Tiro, interessado em comerciar com a Índia, partiu em viagem para lá levando dois sobrinhos. Quando o barco chegou às costas da Etiópia, foi atacado por bárbaros, que afogaram os marinheiros e mataram o comerciante. Acontece que seus dois sobrinhos, Edésio e Frumêncio, tinham descido do barco, e estavam nesse momento sob uma árvore na praia, entretidos na leitura de um livro. Quando foram descobertos, não os quiseram matar, mas os levaram como escravos ao rei de Axum.
Maniqueu ou Manes (século III), o infeliz fundador da religião gnóstica conhecida como maniqueísmo, colocou Axum junto com Roma, Pérsia e a China, como uma das quatro potências de seu tempo. Por outro lado, é afirmado que já no Século IV, justamente o do qual nos ocupamos, a região da Etiópia foi uma das primeiras a adotar o cristianismo como religião oficial. O que parece ser confirmado pelos fatos sucessivos que narramos.
Sucedeu então que o soberano etíope, encantado com a inteligência e sabedoria dos dois escravos, tomou Frumêncio como secretário, e Edésio como copeiro. Os dois irmãos, que eram cristãos, continuaram a praticar sua fé, e serviram o rei até sua morte. A regência do reino coube então à rainha por ser seu filho Ezana menor de idade. A soberana estimava muito e tinha em tão alta conta Frumêncio, que lhe confiou a educação do futuro rei.
Por esse tempo um dia apareceram na corte alguns comerciantes católicos Greco-romanos. Com a ajuda deles, os dois irmãos obtiveram da rainha licença para erguer uma igreja próxima ao porto, que se tornou uma das primeiras senão a primeira semente do cristianismo na África negra.
Após concluírem a missão de educar o príncipe, subindo este ao trono, Frumêncio e Edésio dele obtiveram licença para voltar à pátria. Mas cada um dos irmãos seguiu seu próprio caminho: Edésio voltou para sua terra natal (Tiro), e São Frumêncio foi para Alexandria, no Egito.
Ora, era arcebispo de Alexandria o extraordinário lutador contra o arianismo, Santo Atanásio. Dirigindo-se a ele, Frumêncio lhe informou que os etíopes estavam ansiosos para seguir o cristianismo, e que só necessitavam para isso de auxílio. Atanásio, reconhecendo as qualidades morais e espirituais de seu interlocutor, disse-lhe que ninguém estava mais apto para esse apostolado do que ele próprio. Sagrou Frumêncio bispo, e o mandou de volta à Etiópia com um grupo de missionários.
Frumêncio e os seus foram acolhidos muito cordialmente pelo rei Ezana, seu antigo discípulo, que foi um dos primeiros a se converter, e com ele a maior parte de seus súditos.
Em virtude da bondade e santidade de Frumêncio, o povo etíope passou a chamá-lo Abba Salama, que alguns traduzem como Pai da Paz, ou Portador da luz. Ele se dedicou com todas suas forças a evangelizar o país que o adotara, até sua morte ocorrida em 380.
Como são imperscrutáveis os caminhos da Providência! Se Frumêncio não tivesse com seu irmão descido do navio para se ocupar na leitura o tempo em que aguardavam no porto de Adulis, provavelmente teria sido morto pelos negros que tinham assaltado o navio, junto com os outros tripulantes. E assim não teria levado a mensagem evangélica à população etíope. Esta depois permaneceria fiel também durante a tempestade islâmica no século VII. Infelizmente, essa cristandade, praticamente inteira, aderiu depois à igreja dita ortodoxa.
É curioso que o Martirológio Romano atual afirma que São Frumêncio vivia na Índia: “Na Índia, São Frumêncio, bispo que primeiro vivia ali como cativo. Mas depois foi sagrado bispo por Santo Atanásio, e propagou o Evangelho naquela província”, que não diz qual é.
Entretanto, o Martirológio Romano Monástico confirma a história acima dizendo no mesmo dia: “Igualmente no século IV, a volta a Deus de São Frumêncio. Originário da Índia, foi levado como escravo para o Egito, e consagrado bispo por Santo Atanásio de Alexandria. É considerado o apóstolo da Etiópia”. Em alguns lugares se comemora sua festa no dia 30 deste mês.