SANTO ALBERTO MAGNO

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Santo Alberto Magno – Igreja de Santa Maria dell’Anima, em Roma / Foto: Fr. Lawrence Lew, O.P

Cientista, filósofo e teólogo, conhecido como “o Grande” e “Doctor Universalis” por seu gênio extraordinário e amplo conhecimento, era proficiente em todos os ramos do aprendizado cultivados em sua época; professor de São Tomás de Aquino, foi chamado por um contemporâneo de “maravilha e milagre de sua época”.

  • Plinio Maria Solimeo

Ao proclamar Alberto Magno Santo e Doutor da Igreja, no dia 16 de dezembro de 1931, o Papa Pio XI declarou que “o presente momento parece ser o tempo quando a glorificação de Alberto Magno seria mais calculada para conquistar almas à submissão do doce jugo de Cristo. Alberto é exatamente o santo cujo exemplo deveria inspirar esta idade moderna, tão ardentemente procurando paz, e tão cheia de esperança em suas descobertas científicas”[i]. Veremos por quê.

         Santo Alberto Magno nasceu em Lauingen, cidade da Suábia bávara, pelo ano de 1205 ou 1206, embora muitos historiadores deem seu nascimento em 1193. Era o mais velho dos filhos do Conde de Bollstaedt, uma das mais ilustres famílias do país.

         Desde cedo foi tomado pela sede de saber, de modo que nem pensou em seguir a carreira das armas, na qual se notabilizaram gloriosamente seus ancestrais. É nobre e rico, mas quer ser sábio. Foi por isso que, depois dos primeiros estudos na sua terra natal, foi mandado estudar na universidade de Pádua, que era para as ciências o que a de Paris era para a filosofia e a teologia. Lá residia também um tio seu. Com aplicação e entusiasmo, cursou gramática, dialética, retórica, música, geometria, aritmética e astronomia, sob a direção de sábios mestres. Observador atento, buscava uma explicação para tudo o que via. Tinha “o olho incessantemente aberto sobre o grande livro do mundo exterior, e se aplicava a ler suas páginas maravilhosas. Com seus amigos fazia numerosas excursões nas vilas e províncias vizinhas, observando com olhar penetrante todos os fenômenos, e procurando explicá-los”[ii].

         Entretanto, nada disso prejudicava sua profunda piedade e seu interesse pelas verdades eternas.

Basílica de São Domingos, em Bolonha. Neste lugar estava o segundo convento da Ordem, o de São Nicolau, em vida de Santo Alberto

Define sua vocação religiosa

         Quando chegou o momento de decidir sobre a sua vocação, ele tinha a escolher entre o estudo do direito, que lhe abriria grandes possibilidades no mundo, e a carreira eclesiástica, que não lhe oferecia menores chances de sucesso. Mas ele considerava também a vida religiosa, na pobreza e na humildade, embora essa o impedisse de prosseguir seus estudos e o aprofundamento nas ciências.

         Um dia em que, perturbado por esses pensamentos, rezava diante de uma imagem de Nossa Senhora na igreja dos dominicanos, pareceu-lhe ouvir estas palavras: “Alberto, meu filho! Deixa o mundo e entra na Ordem dos Pregadores, da qual eu obtive de meu Filho a fundação para a salvação do mundo. Tu te aplicarás corajosamente às ciências segundo as prescrições da Regra, e Deus te cumulará de uma tal sabedoria, que a Igreja toda inteira será iluminada pelos livros de tua erudição”[iii].

         Entretanto, a oposição da família a esse projeto segurou ainda Alberto no mundo. Mas a Providência velava. Certo dia do ano 1223 apareceu para pregar na igreja dos dominicanos seu Superior Geral, o Beato Jordão de Saxe. E o fez com aquele carisma de atrair as almas que lhe era peculiar, de tal modo que Alberto, que o ouvia, apenas terminada a pregação, foi lançar-se a seus pés suplicando-lhe que o recebesse como filho.

         O olhar penetrante do sucessor de São Domingos como Mestre Geral da Ordem dos Pregadores — que, apesar de não ter sido canonizado formalmente, foi sempre venerado como santo, tendo seu culto confirmado pelo Papa Leão XII em 1826 — logo percebeu o tesouro que ali se encerrava, e o recebeu de braços abertos. Alberto tinha então 30 anos de idade.

Professor do “Doutor Angélico”

Alberto foi enviado a Bolonha, onde estava o segundo convento da Ordem, o de São Nicolau, e à sua universidade, que passava por ser o segundo centro do mundo científico de então. Lá estudou filosofia e teologia com tanto êxito, que foi enviado a Colônia, para ensinar essas matérias, com o aplauso de toda a cidade. “O que mais se admirava nele, é que juntava a essa profunda erudição, que atraía todo mundo à sua escola, uma simplicidade, uma modéstia e uma humildade prodigiosas”[iv].

         Tendo falecido o Beato Jordão de Saxe no ano de 1237, Frei Alberto ficou em seu lugar até a eleição do sucessor, o que se deu no dia seguinte ao de Pentecostes de 1238, quando São Raimundo de Penaforte foi eleito.

         Santo Alberto foi enviado depois para ensinar sucessivamente em várias casas de sua Ordem, especialmente em Hildesheim, Friburg, Regensburg e Strasbourg. Voltando a Colônia, teve por discípulo Tomás de Aquino, o futuro Doutor Angélico — na ocasião um jovem recém saído da adolescência, tímido e reservado, o que lhe valeu de seus colegas a alcunha de “boi mudo”. Mas o mestre, tendo descoberto a subtilidade de seu espírito, profundidade de pensamento, e sua grande e fiel memória, afirmou que um dia esse “boi mudo” mugiria tão alto, que seria ouvido em toda a Terra.

Túmulo de Santo Alberto Magno na cripta da igreja de Santo André, em Colônia, Alemanha

O “Doutor Universal”

Em 1245 o Mestre Geral da Ordem enviou Santo Alberto a Paris, onde estava o Colégio Santiago, o mais importante dos dominicanos, incorporado à Universidade da Cidade Luz, que era, por sua vez, o mais afamado centro de estudos da Idade Média. Suas aulas tiveram um êxito estrondoso, e em pouco tempo as salas foram insuficientes para conter a multidão que ia ouvi-lo. A praça onde ele ensinava então em Paris conserva seu nome até hoje, se bem que de modo deturpado: “Place Maubert”, de “Maître Albert”[v].

De tal maneira foi o fulgor dessa luz, que dele se dizia na Idade Média: “Mundo luxisti, quia totum scibile scisti” (Iluminaste o mundo, porque soubeste tudo o que se pode saber), e “onde quer que assente sua cátedra, parece monopolizar a todos os amantes da verdade”[vi]. Ele foi chamado pelos seus contemporâneos de “Doutor Universal”, tal a amplidão de seus conhecimentos.

“Não contente em estabelecer as leis da investigação, Alberto esforça-se por recolher todos os frutos da experiência antiga, entesourados em Aristóteles, Avicenas e Nicolau de Damasco, maturando-os e aumentando-os com sua própria experiência”[vii].

No capítulo provincial da Ordem, em Worms, no ano de 1254, Frei Alberto foi eleito Provincial da província alemã. Esta abarcava também a Holanda, Flandres e Áustria. Viajando sempre a pé e mendigando o alimento e a pousada, ele visitou todos os conventos sob a sua jurisdição. Dois anos mais tarde, chamado por Alexandre IV, foi a Agnani, na Itália, onde refutou Guilherme do Santo-Amor, professor da Universidade de Paris que pregava contra as Ordens mendicantes.

Em Colônia, fundou o convento do Paraíso, para as filhas da nobreza. Enquanto isso, rezava, estudava e ensinava.

Entretanto, por mais que amasse os livros e a ciência, curvou-se ante a obediência e aceitou o bispado de Regensburg. Exerceu sua dignidade episcopal com a mesma seriedade com que levou seus estudos, aplicando-se inteiramente aos deveres de seu cargo, visitando a diocese, pregando, reformando, santificando.

Mas isso foi só um parêntese de dois anos em sua longa vida, pois à força de insistência obteve do Papa dispensa do cargo e voltou para os livros, as aulas e as ciências. Se o Papa lhe deu essa dispensa, deu-lhe, no entanto, outra tarefa bastante difícil: pregar a Cruzada na Alemanha. Com o mesmo zelo dedicou-se o Magno Alberto a essa empresa, obtendo grande sucesso, levando considerável número de senhores a receber no peito a Cruz e a partir para a Palestina.

“Nos dez anos que se seguiram, empreendeu frequentes viagens de Brenner a Antuérpia, de Colônia a Lyon; e, condescendente com o desejo dos bispos ou de seus Irmãos, pregava, consagrava altares e igrejas, conferia ordens sacras, e semeava a seu passo bênçãos, indulgências e o suave perfume de suas virtudes”[viii].

Em defesa do discípulo amado

Santo Alberto já estava avançado em idade quando soube que alguns professores seculares da Universidade de Paris convenceram o reitor a condenar algumas proposições de Tomás de Aquino, falecido em 1274. Seu antigo mestre, apesar dos achaques da idade e da distância, acorreu de Colônia a Paris, a fim de defender a ortodoxia de seu discípulo predileto. E o fez com sucesso.

Santo Alberto amava tanto esse seu santo discípulo que a notícia de sua morte “foi um pesado golpe para ele, e declarou que ‘a Luz da Igreja’ tinha se apagado […]. É dito que depois, cada vez que se mencionava o nome de Tomás, ele não podia conter suas lágrimas”[ix].

Santo Alberto Magno pode ser considerado o primeiro que separou com precisão o campo da filosofia do da teologia. A modernidade de Santo Alberto está “em seu amor à verdade, por suas ardentes aspirações de toda a alma, por sua intuição profunda da interdependência de todas as ordens do conhecimento, por sua doutrina da harmonia pré-estabelecida entre os descobrimentos da razão e a fé, entre a ciência e a revelação, entre a vontade e a graça, entre a Igreja e o Estado […]. Seu mérito principal está em ter visto, antes que ninguém, o enorme valor que a filosofia de Aristóteles podia ter no dogma cristão. Ao apoderar-se dele para levantar sobre seus princípios fundamentais uma construção teológica, originava uma verdadeira era nas escolas de seu tempo. São Tomás aperfeiçoará sua ideia, mas ele é o iniciador; ele reúne os materiais e planeja a construção, que levantará o gênio sintético do discípulo. Sem o formidável e fecundo labor de Alberto Magno, apenas podemos conceber a Suma Teológica”[x].

Um dia em que o mais de octogenário Mestre Alberto estava dando uma de suas luminosas aulas, fez-se de repente branco em sua mente. Ele sabia que era o sinal que Nossa Senhora lhe dera, de que toda a ciência lhe fora concedida por Deus para serviço do próximo, ser-lhe-ia tirada. E de que seus dias estavam contados. Viveu os últimos três anos de sua vida numa espécie de semilucidez, falecendo em Colônia em 15 de novembro de 1280. Havia seis anos que seu discípulo amado partira, para receber o prêmio demasiadamente grande que Deus destina àqueles que o servem.

Alberto Magno foi beatificado por Gregório XV em 1622 e canonizado por Pio XI em dezembro de 1931.


[i] <TBODY>Albert the Great by M. Albert Hughes, O.P., Spirituality Today, Autumn 1987, Vol. 39 Supplement, online edition.

[ii] Les Petits Bollandistes, “Vies des Saints” d’après le Père Giry, Bloud et Barral, 1882, vol. 13, p. 419.

[iii] Id., p. 420.

[iv] Id. 421.

[v] Id. 422.

[vi] Fr. Justo Perez de Urbel, O.S.B., “Año Cristiano”, Ediciones Fax, Madrid, 1945, vol. IV, p. 349.

[vii] Id. Ib.

[viii] Edelvives, “El Santo de Cada Dia”, Editorial Luis Vives, S.A., Saragoça, 1949, vol VI, p. 157.

[ix] D.J. Kennedy, St. Albertus Magnus, The Catholic Encyclopedia, 1910, CD Room Edition.

[x] Fr. Justo Perez de Urbel, op. cit., p. 351.

  Fonte: Revista Catolicismo, Nº 875, Novembro/2023

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