Há 170 anos era proclamado o dogma pelo Papa Pio IX.
Ó Maria concebida sem pecado! Rogai por nós que recorremos a vós!
Outra grande festividade litúrgica deste mês natalino é a Imaculada Conceição da Santíssima Virgem. Comemorada pela Igreja desde o século VII –– e pelos fiéis em geral desde os primórdios do Cristianismo, estendendo-se ao longo dos séculos ––, esse privilégio ímpar da Mãe de Deus só foi proclamado dogma em 8 de dezembro de 1854, pelo Bem-aventurado Papa Pio IX.
Fica assim revelado que muito antes da solene Proclamação já havia grande e universal devoção a Nossa Senhora enquanto Imaculada. A data de 8 de dezembro foi escolhida por somar nove meses antes de Seu nascimento, comemorado no dia 8 de setembro: a Natividade da Virgem Maria.
A celebração da Imaculada Conceição tem muito a ver com o Natal, pois é o privilégio da Mãe Puríssima do Menino Jesus, que veio ao mundo para redimir todo o gênero humano devido à mancha do pecado original.
Com esse dogma, Nossa Senhora foi solenemente declarada isenta de qualquer mancha original. Declaração feita por virtude do Magistério infalível da Santa Igreja, com base nos Evangelhos, em tradições muito antigas e em sustentações doutrinarias de incontáveis Padres da Igreja, Santos e Teólogos.
Desde o primeiro instante de sua concepção, Nossa Senhora, “por singular graça e privilégio de Deus Onipotente”*, foi preservada do pecado. Ela foi sempre cheia da graça Divina. Esta é uma verdade de fé, ou seja, uma verdade definida ex cathedra, na qual todo católico deve crer.
Nesse sentido, há incontáveis costumes. Um deles, por exemplo, é do século XV: na Universidade de Paris nenhum aluno era admitido se não defendesse que Maria foi concebida sem pecado original. Costume que foi adotado por outras universidades, como a famosa Universidade de Coimbra.
Em memória desta data jubilosa –– 170 anos da Proclamação do dogma ––, transcrevemos a seguir trechos da magistral Bula Ineffabilis Deus (Deus inefável), promulgada em 8 de dezembro de 1854, no 9º ano do Pontificado de Pio IX, que passou para a História com a glória de ficar conhecido como o “Papa da Imaculada Conceição”.
EXCERTOS DA BULA
INEFFABILIS DEUS*
“Desde todos os tempos, escolheu Deus e predestinou uma mãe para o seu Unigênito Filho, na qual se encarnaria e viria ao mundo, quando a abençoada plenitude dos tempos houvesse chegado. E a Ela dispensou Deus mais amor que a todas as outras criaturas, e nela somente achava agrado, com a mais afetuosa complacência.
Por isso a cumulou, de maneira tão admirável, da abundância dos bens celestes do tesouro de sua divindade, mais que a todos os outros espíritos angélicos e todos os santos, de tal forma que ficasse absolutamente isenta de toda e qualquer mancha de pecado, podendo, assim, toda bela e perfeita, ostentar uma inocência e santidade tão abundantes, quais outras não se conhecem abaixo de Deus, e que pessoa alguma, além de Deus, jamais alcançaria, nem em espírito.
Com efeito, era conveniente que tão venerável Mãe brilhasse sempre aureolada do esplendor da mais perfeita santidade, e que fosse de todo isenta até da própria mácula do pecado original, alcançando, assim, o mais completo triunfo sobre a antiga Serpente (Gn 3, 15) […].
Desde os tempos remotos, os bispos da Igreja, eclesiásticos, ordens religiosas e até imperadores e reis dirigiram fervorosos memoriais à Sé Apostólica, em prol da definição da Imaculada Conceição da Virgem Mãe de Deus como dogma da fé católica. Mesmo em nossos dias, reiteraram-se estas petições […].
Tendo plena confiança no Senhor de que já chegou o tempo oportuno para a definição da Imaculada Conceição da Virgem Maria, Mãe de Deus, que as Divinas Escrituras, a veneranda Tradição, o desejo incessante da Igreja, o singular consentimento dos Bispos católicos e dos fiéis, e os atos e constituições assinalados dos Nossos antecessores ilustram e proclamam; havendo considerado diligentemente todos os acontecimentos e tendo dirigido a Deus solícitas e sinceras preces, Nós julgamos não devermos fazer tardar por mais tempo a ratificação e definição, por Nossa autoridade suprema, da Imaculada Conceição da Virgem, satisfazendo, assim, os mais santos desejos do Orbe Católico e de Nossa própria devoção para com a Santíssima Virgem; e honrando, na Virgem, sempre mais o seu Filho Unigênito, Jesus Cristo, Senhor Nosso, visto que toda honra e louvor votados à Mãe revertem para o Filho.
Pelo que, em oração e jejum, não cessamos de oferecer a Deus Pai, por seu Filho, Nossas preces particulares e as de todos os filhos da Igreja, para que se dignasse dirigir e fortalecer Nossa inteligência com a força do Espírito Santo. Imploramos, ainda, a ajuda de toda a milícia celeste e, com verdadeiros anelos do coração, invocamos o Paráclito.
Portanto, por sua inspiração, para honra da Santa e Indivisa Trindade, para glória e adorno da Virgem Mãe de Deus, para exaltação da Fé Católica e para a propagação da Religião Católica, com a autoridade de Jesus Cristo, Senhor Nosso, dos Bem-aventurados Apóstolos Pedro e Paulo, e Nossa, declaramos, promulgamos e definimos que a Bem-aventurada Virgem Maria, no primeiro instante de sua Conceição, foi preservada de toda mancha de pecado original, por singular graça e privilégio do Deus Onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador dos homens, e que esta doutrina está contida na Revelação Divina, devendo, por conseguinte, ser crida firme e inabalavelmente por todos os fiéis.
Em consequência, se alguém ousar –– o que Deus não permita –– pensar contrariamente ao que definimos, saiba e esteja ciente de que ipso facto incidiu em anátema, de que naufragou na fé e apostatou da unidade da Igreja; além disso, por sua própria causa incorre nas penalidades estabelecidas por lei, caso se atreva a manifestar, por palavras ou por escrito, ou por outros quaisquer meios externos, sua opinião íntima.
Nossa língua transborda de alegria e nosso coração rejubila. Rendemos e não cessaremos de render os mais humildes e sinceros agradecimentos a Cristo Jesus, Senhor Nosso, por Nos ter concedido, embora indigno, por singular favor seu, decretar e oferecer esta honra, glória e louvor à Santíssima Mãe. Ela, toda pura e imaculada, esmagou a cabeça envenenada do mais cruel dragão, trazendo ao mundo a salvação; Ela é a glória dos Profetas e dos Apóstolos, a honra dos Mártires, a coroa e delícia dos Santos; o refúgio mais seguro, o mais valioso amparo de quantos se acham em perigos. Com o seu Unigênito Filho, Ela é a mais poderosa Mediadora e Consoladora no mundo universo. Ela é a suma glória e ornamento, a fortaleza inexpugnável da Santa Igreja.
Pois Ela destruiu todas as heresias e livrou os povos e nações fiéis de todas as calamidades gravíssimas. Também a Nós livrou-Nos de tantos perigos que nos assediavam. Temos, pois, confiança e esperança absolutas e totais de que a Bem-aventurada Virgem, por seu patrocínio valiosíssimo, fará com que todas as dificuldades sejam removidas e todos os erros dissipados, a fim de que Nossa Santa Madre Igreja Católica possa florescer, sempre mais, entre todas as nações e povos e possa difundir-se seu reino ‘de mar a mar, do rio até aos confins da terra’ (Sl 71, 8), e desfrute de perfeita paz, tranquilidade e liberalidade.
Ela obterá, também, perdão aos pecadores, saúde aos doentes, alento aos fracos, consolo aos aflitos, amparo aos que estão em perigo. Ela há de apagar a cegueira espiritual dos que erram, para que possam voltar às sendas da verdade e da justiça, e para que haja um só rebanho e um só pastor.”
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* Pio IX, Bula Ineffabilis Deus, de 8 de dezembro de 1854, Editora Vozes Ltda., Petrópolis – RJ, 1947. Acima, apenas excertos do magistral documento da definição dogmática. Aqueles que desejarem a íntegra, podem encontrá-la no seguinte link do site oficial do Vaticano: