O debate que animou os dois últimos Sínodos dos Bispos sobre a família (2014 e 2015) tem suscitado reações opostas, mas os documentos publicados não avançaram propostas concretas sobre como curar os males da vida matrimonial e doméstica. Alguns comentaristas concluíram que os Sínodos não mudaram nada de substancial. No entanto, a Exortação Apostólica pós-sinodal Amoris laetitia, recentemente publicada pelo Papa Francisco, propõe explicitamente uma nova abordagem global da pastoral familiar.
Para termos uma opinião abalizada que pudesse esclarecer a questão, entrevistamos o estudioso italiano Guido Vignelli [foto ao lado], residente em Roma, diretor durante 20 anos do Projeto SOS Jovens e ex-membro da Comissão sobre a Família junto à Presidência do Conselho de Ministros da Itália. Recentemente ele escreveu o livro intitulado Uma revolução pastoral – Seis palavras-talismã no debate sinodal sobre a família [foto no alto], precisamente sobre os problemas suscitados pelas palavras, ideias e tendências emergentes após os dois Sínodos. A obra está sendo divulgada em três línguas pela TFP italiana, e uma edição brasileira está sendo preparada.
Guido Vignelli visa sistematicamente a realidade. Ele vai buscá-la no fluxo das modas sempre cambiantes, no curso das ideias em circulação, no estrépito dos acontecimentos atuais. Sua acuidade penetra a modernidade com seus alegres enganos e manifestações otimistas. Visão da realidade é virtude cada vez mais rara, seja nos livros, seja no jornalismo. Prevalece de modo geral o “pensamento único”, o famoso “politicamente correto”.
Ele mostra em suas obras, subjacente à euforia moderna, a profunda insatisfação do homem contemporâneo, consequência do fato de se ter liberado de Deus e menosprezado a sua Lei. Também aborda o tema dos malefícios da televisão e sua ação brutal, particularmente sobre a infância. Seus escritos sobre técnicas modernas têm acolhida sobretudo em meios católicos. Visam devolver à sociedade a felicidade perdida pelo afastamento da Igreja.
Os erros penetrados na Igreja atingem hoje graus paroxísticos. Fiéis são constrangidos em massa a adotar uma “nova mentalidade” e a ter a salvação eterna como fruto apenas de “boa consciência”, sem consideração pela lei moral. Uma alegada sinceridade de sentimento prima sobre a noção de pecado. Pecado? Este é tido como um conceito superado.
Nesta entrevista, Guido Vignelli, a propósito de seu livro Uma revolução pastoral, analisa um método insidioso de penetração de erros atuais na Igreja com o fim de destruir a moral básica da instituição familiar. Ferramenta essencial desse método são as “palavras-talismã”, cuja magia mediática penetra os espíritos e até importantes documentos do magistério eclesiástico. Essa obra de Vignelli se inspira na análise percuciente da realidade efetivada por Plinio Corrêa de Oliveira em sua obra Baldeação Ideológica Inadvertida e Diálogo, obra básica do pensamento católico contra-revolucionário, da qual este autor italiano é grande difusor na Europa.
Catolicismo — Que tipo de mudanças são esperadas na nova pastoral familiar?
Guido Vignelli — Alguns afirmam que essas mudanças vão modificar a pastoral familiar não em sua substância, mas apenas em seu “estilo” de expressar-se e de agir. Cumpre objetar-lhes que é precisamente este campo delicado e escorregadio que causará problema. As mudanças na linguagem e na prática podem ser decisivas porque, quando se modifica a maneira de expressar e de agir, as coisas tendem a mudar.
Tanto os sínodos episcopais quanto a posterior Exortação pontifícia Amoris laetitia propuseram “um novo léxico que revoluciona a pastoral”, como advertiu “Avvenire” — jornal da Conferência Episcopal Italiana (24-4-16). Portanto, pode-se esperar que esse “léxico revolucionário” exercerá influência cada vez maior, não só na questão familiar, mas também em toda a vida eclesial.
A mensagem sinodal e a papal se impõem não tanto pelo seu diagnóstico e sua terapia, quanto pela sua intenção explícita de promover uma “conversão pastoral” da linguagem e da prática que favoreça uma “inversão de perspectiva” não só na vida familiar, mas também eclesial, como disseram os cardeais que apresentaram a Amoris laetitia à imprensa. A “conversão pastoral” consiste em adequar critérios, métodos e meios eclesiais à pretensão do homem moderno de agir seguindo apenas a própria consciência subjetiva e satisfazendo as exigências permissivas daí resultantes. A “inversão de perspectiva” consiste em colocar não mais os meios a serviço do fim, mas o fim ao serviço dos meios, ou seja, em colocar a verdade e as leis evangélicas a serviço da nova pastoral eclesial, o que vale também para o direito canônico e inclusive para os Sacramentos.
Para esse fim, surgiu a perigosa tendência de encarar a verdade evangélica sobre o casamento e a família como se fosse “um modelo ideal”, ou seja, uma bela teoria, mas muito abstrata e difícil de alcançar, que depois vai adequar-se às exigências pastorais exigidas pelas situações concretas. Por isso se prevê avaliar e resolver essas situações recorrendo a atenuantes morais e exceções, derrogações e licenças jurídicas. Desta forma, contudo, o mencionado modelo evangélico perde o seu rigor ideal, e com ele também a sua força de sedução e atração; além disso, o acúmulo de exceções à regra acaba frustrando a própria regra, deslizando-se na insegurança jurídica.
Catolicismo — Qual é o papel dessa nova linguagem eclesial nas mudanças previstas?
Guido Vignelli — A nova linguagem sinodal é dominada por certas palavras-chave que, mediante máximas correlativas, fórmulas e slogans, definem os problemas examinados e orientam as soluções propostas, de modo a sugerir uma mudança substancial de toda a prática eclesial. Em resumo, essas palavras-chave são neutras e de uso comum. Na prática, no entanto, elas estão inseridas em um contexto que lhes confere um significado enganoso e as faz exercer uma perigosa influência sobre os que as usam, manipulando a sensibilidade e a mentalidade dos fiéis através de uma técnica de persuasão psicológica oculta, análoga àquela utilizada pelos sistemas de propaganda de massa, por exemplo, na publicidade.
É por isto que tais palavras nós as podemos definir como “palavras-talismã”, comparando-as com as fórmulas mágicas. Ou seja, elas não se limitam a exprimir o que significam (uma ideia, um valor, um julgamento), mas tendem a realizar aquilo que significam, isto é, a produzir um efeito (uma escolha, uma posição, um comportamento) capaz de seduzir e atrair um ouvinte ingênuo, distraído ou conformista. Quem usa tais palavras-talismã é depois empurrado inconscientemente para uma determinada direção, arriscando ser “baldeado” de uma posição antiga e rigorosa para uma nova e permissiva.
Como se sabe, esse tipo de palavras e o mecanismo sutil desencadeado por elas foram analisados com acuidade pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira em sua obra intitulada Baldeação ideológica inadvertida e Diálogo (1965), um ensaio de importância histórica e profética, muitas vezes surrupiado por estudiosos e apologistas por sinal, mas quase nunca citado como fonte autorizada.
Catolicismo — Quais são as “palavras-talismã” que emergiram dos dois Sínodos?
Guido Vignelli — De acordo com protagonistas e observadores oficiais, as palavras-talismã dominantes no debate sinodal e confirmadas por Amoris laetitia foram as seguintes: pastoral –misericórdia – escuta – discernimento – acompanhamento – integração. Essas seis palavras se repetem com frequência nos atos oficiais dos dois Sínodos: pastoral (90 vezes), misericórdia (48),discernimento (45), acompanhamento (102); a palavra integração ocorre apenas 24 vezes, mas, se a unirmos à palavra que a pressupõe, ou seja, acolhida, repetida 74 vezes, juntas formam um total de 98. Houve outras palavras-chave recorrentes, como complexidade, aprofundamento, desafio, mas que não parecem ter a importância das precedentes.
Essas palavras-talismã são relacionadas entre si. A nova pastoral exige tratar com misericórdia as situações conjugais e familiares imorais, que não devem por isso ser julgadas eticamente, mas através da escuta de suas experiências e necessidades, a fim de discernir em todas o que é “autêntico”, com vistas a acompanhá-las rumo a um processo de acolhida, obtido com a plena integração na comunidade eclesial e na vida sacramental.
Catolicismo — Qual é a impostação da nova pastoral?
Guido Vignelli — A nova pastoral familiar é baseada no pressuposto de que os agentes pastorais devem limitar-se a utilizar apenas métodos e meios de “diálogo”, da persuasão e do exemplo, renunciando à reprovação, à denúncia, para a condenação e punição do pecador. Acredita que métodos penais não são misericordiosos. Consequentemente, mesmo quando a culpa é obstinada, pública e escandalosa, nenhum pecador pode ser marginalizado ou expulso da comunidade da Igreja.
Em concreto, o pecador não é tanto perdoado quanto escusado, aduzindo-se atenuantes justificatórias, por exemplo, o fato de viver em uma situação matrimonial ou familiar supostamente insanável. Então, tende-se ser misericordioso, não só com o pecador (que sempre pode converter-se), mas também com a sua situação pecaminosa (que nunca pode converter-se, mas deve simplesmente desaparecer); não se limita a “odiar o pecado e amar o pecador”, como afirma Santo Agostinho, mas chega-se a justificar o pecado e a absolver o pecador impenitente, concedendo-lhe até o acesso à Sagrada Comunhão sem prévia conversão e reparação. Tal misericórdia é contrária ao ensinamento da Igreja, inclusive o da encíclica Dives in Misericordia de João Paulo II.
Esse permissivismo, que ontem era concedido apenas aos que erravam, estende-se hoje aos pecadores públicos. Se esta abordagem liberal fosse aplicada com rigor, nenhuma sociedade poderia conservar-se por longo tempo, nem sequer a da Igreja, que é divina, porque os tribunais tornar-se-iam ilícitos e, portanto, seriam abolidos.
A abordagem metodológica está em suma na exigência pastoral e no primado da misericórdia. O problema é que essas duas palavras-chave foram falsificadas em seu significado e traídas na sua missão. Na ânsia de diagnosticar as situações pecaminosas absolvendo-as da devida condenação moral, apastoral tende a eludir a verdade revelada; na ânsia de curar essas situações poupando-as dos inevitáveis sofrimentos, a misericórdia tende a escapar da justiça divina. O resultado é uma pastoral relativista, incapaz de iluminar os que erram e uma misericórdia permissiva incapaz de converter os pecadores.
Catolicismo — Qual é a teoria implícita nessa nova pastoral?
Guido Vignelli — Se consideradas nas suas relações, as mencionadas palavras-chave se explicam e se apoiam mutuamente, sugerindo uma nova metodologia que nos leva a passar de um conceito rigoroso a um permissivo, não só da pastoral doméstica, mas também da moral familiar. A avaliação moral é de fato posta na dependência dos tempos, lugares, pessoas e situações, com base, portanto, em critérios não mais absolutos (ou seja, universais e necessários), mas relativistas (ou seja, particulares e subjetivos); os próprios conceitos de “mal absoluto” e “estado de pecado” são implicitamente rejeitados como abstratos e rigoristas. O que leva ao seguinte paradoxo: quanto mais um cristão se obstina em viver num estado público de pecado, violando gravemente os mandamentos relativos à fidelidade e à castidade matrimonial, ele pode lícita e canonicamente considerar-se “simul justus et pecador” (“que é pecador justificado”), como pretendia o heresiarca Lutero.
A nova pastoral pressupõe e insinua uma teoria moral relativista e permissiva, semelhante à “nova moral” denunciada em seu tempo por Pio XII: afirma-se que, “libertada das sutilezas sofísticas do método tradicional, a moral seja reconduzida à sua forma originária e remetida à inteligência e à determinação da consciência individual. […] A ‘nova moral’ afirma que a Igreja, em vez de fomentar a lei da liberdade humana e do amor, pelo contrário leva, quase exclusivamente e com excessiva rigidez, à firmeza e intransigência das leis morais cristãs, recorrendo com frequência àqueles ‘sois obrigados’ e ‘não é lícito’ que têm muito sabor de um pedantismo desalentador. […] Com o resultado de que a acusação de dureza opressora, do movimento ‘nova moral’ contra a Igreja, vai na verdade atingir em primeiro lugar a própria Pessoa adorável de Cristo” (Pio XII, Rádio Mensagem de 23 de março de 1952, por ocasião do Dia da Família).
Prepara-se, portanto, uma revolução pastoral no sentido relativista e permissivo. É uma revolução no sentido relativista, porque o diagnóstico das situações familiares se baseia não na avaliação moral objetiva delas, mas em detectar a experiência psicológica subjetiva e prever as consequências práticas, com o perigo de fazer a consciência perder o sentido de pecado, já tão obnubilado. Com efeito, não se fala mais de “situações imorais” (como o concubinato), nem tampouco de “situações irregulares”, mas apenas de “situações complexas” ou “difíceis”. É também uma revolução no sentido permissivo, porque a terapia para tratar dessas situações se reduz ao uso de paliativos e anestésicos que, longe de eliminar as causas do mal, aliviam-lhe apenas os sintomas, ou seja, as consequências dolorosas, com o resultado de eludir o restabelecimento e tornar crônico o vício. Desta forma, a pastoral familiar é reduzida a uma psicologia ou sociologia da família semelhante à laicista.
Catolicismo — Há também motivos de uma esperança não sentimental, mas racional, quanto ao futuro da família?
Guido Vignelli — Não obstante a mesma análise sinodal admitir que a atual situação familiar global é totalmente desastrosa, pesquisas sociológicas e estatísticas também revelam alguns sinais de esperança quanto ao futuro. Na verdade, apesar de as autoridades tornarem cada vez mais difícil para os jovens constituir família, opondo obstáculos culturais, políticos e econômicos inimigos da castidade, da estabilidade e da procriação, o desejo de família está crescendo precisamente entre as últimas gerações; isto também se aplica à nobre nação brasileira. Talvez seja até para perverter essa saudável tendência juvenil que a propaganda revolucionária tenta distorcer o conceito de família, tornando-a “pluralista”, ou seja, introduzindo nela todas as formas possíveis de convivência (inclusive a homossexual). Mais uma razão para impelir os cristãos a defender a verdadeira identidade e definição de família. Trata-se da própria sobrevivência da humanidade, como também da Igreja.
TIPICAMENTE MODELO ESQUERDISTA, as palavras que os laboratorios de engenharia social adotam em suas doutrinações para subverterem o povo no marxismo, seu esquema estaria sendo plagiado para ser adotado na Igreja, na difusão de sua doutrina no presente pela “Nova Pastoral”, de forma aparentemente correta, mas contendo elementos que conduzem à sua deformação em relação ao sentido original e acabaria por lançar as mentes no relativismo.
A metodologia relativista continua sendo adotada pela esquerdista Teologia da Libertação, a famigerada TL, que continua repassando a doutrina da Igreja transmutada em socialismo, ainda muito em voga e encontrada constantemente em varios livros, folhetos paroquiais, dominicais, como em “O DOMINGO” da Paulus, idem tradução das S Escrituras, como da idem “BIBLIA, EDIÇÃO PASTORAL” etc.
Estaria havendo também um modelo de dissuasão aos erros pessoais, ao pecado, à culpabilidade, mesmo em situações em que as S Escrituras e a doutrina da Igreja sempre se mantiveram rígidas, sem concessões, e doravante se tenderia a relaxá-las em nome de supostos “acolhimentos, tolerancia, perdão, pastoral” e outros termos que desculpem a pessoa!
Outra situação nesse mesmo caso é quase ou nunca versarem sobre a Justiça do Senhor Deus para com os impenitentes pecadores, parecendo que cancelaram a existencia do purgatorio, e mais ainda, a condenação desses ao inferno!
Pareceria que desejariam transforma a Igreja numa seita qualquer das dezenas de milhares do relativismo protestante, onde o o subjetivismo é a marca registrada e o relativismo é o carro-chefe, ou numa sedizente religião dos globalistas!
Já existem algumas incipientes reações de famosos teólogos leigos e do clero a esse esquema que se consideraria modernista, alienante, direcionando ao papa Francisco abaixos-assinados, restando saber se disporá a acolher os pedidos de mudanças de termos e situações, como na A laetitia!