Tempos atrás publiquei artigos denunciando perigos da aproximação do Brasil com a China. Pelo que me recordo, o primeiro foi de janeiro de 2016, ainda no governo Dilma. Sob o título “O Brasil servo” explicava os riscos mortais da aproximação insensata com a China, então vivamente estimulada pelos deputados federais do PT.
Citei nele partes do documento da bancada petista que exigia crescente alinhamento comercial com a China comunista: “A China tem um conjunto de bancos de fomento que oferecem linhas de crédito e investem em projetos no exterior. Esses bancos têm incrementado sua presença na América Latina”.
O título da matéria, “O Brasil servo”, resumia tudo; a direção econômica exigida pelo PT naquele documento no futuro acabaria com a efetiva independência nacional. Depois de numerosas peças sobre a mesma questão, em 18-2-16 escrevi “Clamando no deserto”. Parecia-me estar isolado em minhas denúncias. Ninguém ventilava o tema. Lamentava eu:
“Vez por outra sucede eu ter a sensação de clamar no deserto. Verifico, entre surpreso e desolado, ninguém está dando bola para aquilo por mim tido por importante. […] Vejo com horror o avanço do capital estatal chinês sobre ativos brasileiros. De fato, são gigantescas propriedades no Brasil passando celeremente para o governo do PCC (Partido Comunista Chinês), que vai utilizá-las, mais dias, menos dias, para seus objetivos de dominação de nossos assuntos internos e de hegemonia mundial”.
Não podia imaginar que, quase três anos depois, o assunto retornaria acalorado. Lendo as notícias a respeito da comitiva de deputados federais brasileiros (parece-me, também uma senadora) na China, entristeceu-me e me apavorou o desconhecimento palmar do conteúdo, o balbucio inconclusivo das justificações, a superficialidade arrogante, o primarismo ovante — perdoem-me a próxima palavra, mas a verdade tem seus direitos, — a boçalidade desinibida de muitas das intervenções no debate.
Pobre do país que padecer tal representação popular (rezo a Deus que o plantel lá na China não seja amostra válida da totalidade de nossos representantes). É difícil aqui não recordar o dito amargurado de Ulisses Guimarães: “Está achando ruim essa composição do Congresso? Então espere a próxima: será pior”.
Vou repetir agora o que escrevi dias atrás: 87% das inversões chinesas no Brasil são de empresas estatais. Os eufemismos, no caso sintoma de subserviência e temor, correm soltos, disfarçando tal realidade. Expressões preferidas, “capitais chineses”, “investidores chineses”, “capitais da China”. E, de novo, martelo no óbvio: a imensa maioria dos diretores das estatais pertence ao Partido Comunista Chinês. Congruentemente, sua ação favorece os interesses do comunismo chinês que na América Latina, entre outros objetivos, quer minar a influência dos Estados Unidos e apoia abertamente Venezuela e Cuba.
Nenhum diretor de estatal faz a menor ação que possa prejudicar os interesses do comunismo chinês. Os 13% restantes do capital investido, na maior parte, provêm de empresas com ligações próximas com o governo chinês. Vou fazer uma previsão. Você não vai ser informado que 87% do capital chinês aplicado no Brasil provêm de estatais dirigidas pelo Partido Comunista Chinês. Vai continuar a ler e ouvir “investidores chineses”, “capitais chineses”, “capitais da China”, eufemismos, repito, que ocultam a realidade amedrontadora. Continuo a clamar no deserto. Clamor no deserto –1, digamos.
Mas não quero tratar hoje da disputa acima. Vou falar de outro assunto, mais imediato, reforma agrária. Aqui também já estou começando a clamar no deserto (no caso, clamor no deserto – 2). A verdade evidente, de um óbvio ululante, é que a reforma agrária precisa acabar, já fez mal demais ao Brasil. Prejudicou os pobres, abaixou salários no campo, diminuiu a produção, trouxe insegurança jurídica, tornou improdutivas ou pessimamente aproveitadas terras que poderiam estar produzindo com tecnologia de Primeiro Mundo, gerando riquezas, aumentando a oferta e baixando o preço dos alimentos.
São bilhões e bilhões de reais que ao longo dos anos foram para o ralo (quando não para o bolso de espertalhões, grandes e pequenos). A educação poderia estar mais bem atendida, a saúde, a segurança, sei lá mais o quê. A reforma agrária, disparate sem fim, pesadelo delirante para qualquer um de bom senso, já vitimou 880 mil quilômetros quadrados do território nacional.
Visitem os assentamentos, se puderem (se as patrulhas do MST permitirem), conversem com os vizinhos deles para conhecer na prática o que domina lá dentro. A intimidação, os negócios escusos, as bebedeiras, os roubos, o desrespeito às leis. Tudo isso apoiado pelo INCRA, cuja ação deletéria fez realidade a maldição da reforma agrária para o Brasil. Transcrevo Xico Graziano, ex-presidente do INCRA:
“Em 2015, ao completar 45 anos, o Incra divulgou que em sua existência havia assegurado o acesso à terra para 968.887 famílias, agrupadas em 9.256 assentamentos fundiários, distribuídos por 88 milhões de hectares de terra. Para comparação, basta dizer que toda a área colhida na safra passada somou 78,2 milhões de hectares. O Brasil realizou a maior distribuição de terras, pela via democrática, no mundo. [Os assentamentos são] verdadeiras favelas instaladas no meio rural. Bilhões se investiram nessa agenda. [Não existem dados] que permitam aquilatar a contribuição produtiva dos assentamentos. Não se sabe quanto nem o que produzem. A lacuna é intencional. Uma rosca sem-fim. As entidades que lutam pela reforma agrária sempre foram contra a titulação das terras distribuídas. Por quê? Porque preferem ver os ‘sem-terra’ vivendo, décadas, de forma precária, subordinados ao Estado. Somente dessa forma, os MST da vida conseguem manter sua dominância sobre os pobres coitados, fazendo-os comer na sua mão. E, desgraçadamente, aproveitar-se dessa situação para morder nacos do dinheiro públicos. Não promove, pelo contrário, é contrária à emancipação dos agricultores pobres no campo. Os ‘movimentos sociais’ gostam de criar submissão, a mais desgraçada das misérias humanas. Atualmente, já funciona um enorme mercado, paralelo, de venda de lotes, com a conivência do poder público e a participação dos ‘movimentos sociais’. Existe uma brutal concentração fundiária dentro dos assentamentos rurais, onde quase tudo está, irregularmente, arrendado para outrem. Rola uma tremenda picaretagem agrária nas barbas das autoridades. Que ficam de bico calado.”
Apesar da realidade evidente, continua a conversa fiada de que é preciso fazer uma reforma agrária criteriosa. O bom critério aqui é acabar já com a reforma agrária, parar tudo, desfazer os estragos em curso, e passar a trilhar rumo sensato que ajude produtores, aumente a produção e favoreça de fato os pobres.
Outro ponto que agride os tímpanos: de momento não existe dinheiro para aplicar no programa. Se houvesse recursos, seria moralmente criminoso torrar o escasso dinheiro público na reforma agrária. Crime contra os pobres, crime contra os produtores, crime contra o bem comum.
Terceiro ponto, a partir de agora, sem levar em conta as invasões, vai se aplicar a legislação. Também é enganador dizer que não haverá reforma agrária para invasor. O normal é nem para invasor, nem para ninguém. A medida que vai favorecer os pobres é sumir com a reforma agrária. Terra para quem quer plantar? Sim, a pública. E não indiscriminadamente, com sujeição ao MST e aos apaniguados do INCRA, mas em quadro novo para quem tem capacidade técnica e habilidade comercial.
Uma palavra final sobre a legislação. A legislação brasileira a respeito é péssima em vários de seus aspectos fundamentais, já deu e tem dado margem a toda sorte de abusos, precisa ser urgentemente revista e consertada, quando não extinta.
O presidente marxista Salvador Allende comunistizou o Chile, arrebentou sua economia, aplicando legislação existente, anterior à sua ascensão ao poder. A estatização das empresas no Chile, iniciada em fevereiro de 1971, foi feita com o uso dos então chamados “resquícios legais”.
A legislação existente hoje no Brasil, como a do Chile à época de Allende, tem muitos “resquícios legais”, eufemismo para indicar legislação facilmente utilizável por governantes de esquerda. Se tal legislação não for extinta, propiciará condições para que um futuro governo de coloração petista nos leve no agro à situação hoje padecida pela Venezuela.
Apenas um exemplo entre dezenas de disparates na legislação. A medida natural, lógica dos defensores da propriedade rural (preocupação para a bancada ruralista) é promover já a aprovação de uma PEC que elimine a essência demolidora do artigo 184 da Constituição.
Reza o monstrengo:
“Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. §1º: As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro. § 2º O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação”.
A verdade que salta aos olhos: desapropriar por interesse social é uma gazua, que permitiu sucessão de disparates (roubos, depois de arrombada a porta). Todo mundo sabe que desapropriar por interesse social, espada de Dâmocles, no Brasil é enganação. Logo a seguir vem a foiçada da desapropriação. O título da dívida agrária na prática é o instrumento legal do esbulho. A desapropriação sai por valor inferior ao real (quando não há tramoia e a desapropriação dispara, aí existe comilança para muita gente) e, a mais, o TDA é negociado com grande deságio. Espoliado o proprietário, ali se instalada a doideira dos assentamentos.
Infelizmente já vou avisando, vou clamar no deserto (o clamor –2) reclamando uma PEC que extraia o tóxico do artigo 184. E é veneno que pode no futuro jogar o Brasil no coletivismo agrário. Falta reatividade viva, interesse lúcido, senso efetivo de proteção aos pobres. Inexiste coragem — a patrulha vai cair de quatro — para propor esta medida de necessidade evidente.
A verdade é que parte do Brasil que conta tem tumores de estimação, xodós cultivados, acariciados e alimentados. Gosta de manter tumores cancerosos. E são vários, dos quais lembrei um, a reforma agrária. Poderia lembrar outro, as estatais. No campo das ideias e emoções, a pena romântica (não efetiva) pelos pobres e o igualitarismo difuso. Tantos mais. Por que não o INCRA? Também o INCRA e sua fedentina. Para boa parte dos dirigentes políticos e mesmo para alguns produtores rurais, é tumor de estimação. Precisa ser tocado de leve, nutrido.