Neste dia 20 de julho a Santa Igreja celebra a festa litúrgica do Profeta Elias. Em sua memória segue a transcrição de um comentário feito por Plinio Corrêa de Oliveira em conferência realizada em 14-11-1969. Esse texto não passou pela revisão do autor.
O Rei Ocozias mandou um capitão com cinquenta homens prender o Profeta Elias. Disse-lhe então o capitão: “Ó tu que te tens por homem de Deus, o rei mandou que venhas. Respondendo Elias, disse ao capitão de 50 homens: Se eu sou homem de Deus, desça fogo do céu e te devore, a ti e a teus 50 homens”. (2 Reis, 1, 1). O capitão e todos os soldados foram liquidados.
A primeira reação que este fato poderia produzir em um católico piegas seria a seguinte: Coitados! Afinal de contas, que culpa eles tinham para morrerem dessa maneira?
O fato é relatado como um castigo, e para que esse castigo se explique, devemos considerar que os profetas davam provas de sua missão profética, e os que não queriam reconhecer essa missão profética incorriam no castigo de Deus. Aqueles homens tinham aceitado a incumbência do rei, de prender o profeta Elias, daí concluirmos que eles não reconheciam o profeta; ou se reconheciam, temiam mais o rei do que o profeta. Portanto, nessas condições, mereciam ser duramente castigados.
Qual o sentido desse castigo? Deus não é só justo nem só severo, é também infinitamente misericordioso. Ele não seria Deus se não fosse justo e misericordioso. Mostra-nos todas as suas perfeições, entre elas sua justiça e severidade infinitas.
Nós temos que amá-lo em todas as suas manifestações, inclusive quando a manifestação é de sua justiça. Quando Deus nos mostra sua justiça, Ele o faz para nos atemorizar. É claro que o temor é um dos frutos da manifestação da justiça de Deus, mas não é o único fruto, pois outro fruto é o amor a Deus. Ele quer ser amado na sua justiça e na sua severidade. A severidade para com o mal deve despertar o amor. Esta é a lição que devemos tirar nas tomadas de atitude severas.
Quais são as coisas que a Revolução nega nesse sentido? Prestando atenção, vemos que a Revolução vai cada vez mais dando a ideia de que o homem que detém autoridade só é digno de amor se nunca for severo. Isso se nota em todas as escalas da autoridade. Segundo tal ideia, o pai que jamais é severo é o pai bom e digno de amor, e a autoridade policial que tem pena do ladrão e o deixa escapar é a autoridade policial boa e digna de amor. Está subjacente nisso a ideia de que é preciso não ser severo com o criminoso. E a autoridade que não pune, não castiga, não faz sofrer, essa é a autoridade boa, que deve ser objeto de simpatia.
Ora, essa é uma ideia falsa! Para um homem de coração reto, a severidade atrai o amor. A severidade não é brutalidade, nem vulgaridade. A alguém que nos censure com severidade, com respeito e com a força dos Mandamentos, nós devemos ficar agradecidos. É um sinal de que somos humildes, e que as portas do Céu estão abertas para nós. Caso contrário, seria sinal de que não somos humildes, nem de que as portas do Céu estão abertas para nós. Portanto, devemos amar em Deus também a sua severidade.
Antigamente o pai, dentro de sua casa, apresentava-se sempre um tanto distante, enigmático e majestoso em relação aos filhos. Nem por isso os filhos deixavam de amá-lo. Pai indigno de amor é o que se orienta por uma fórmula como esta: “Eu sou o melhor amigo do meu filho; não temos relações de pai e filho, mas de amigos”. Um pai assim profana sua própria autoridade, pois o pai é muito mais do que amigo. Compreende-se então por que Deus manifesta de vez em quando sua severidade, e a manifesta de modo terrível.
Um bispo antigo de São Paulo escreveu esta frase numa carta pastoral: “A misericórdia de Deus tem mandado mais gente ao inferno do que a sua justiça”. A frase é um pouco desconcertante, mas significa que vão para o inferno mais almas por terem abusado da misericórdia de Deus do que por terem temido demais a justiça de d´Ele. Os abusos da misericórdia são mais frequentes do que defeitos morais por temor excessivo da justiça.
Alguém poderia objetar: Mas onde é que o senhor coloca a bondade? Dou minha resposta com base na figura de Santa Teresinha do Menino Jesus, que tinha amor profundo à bondade de Deus, mas também uma noção profunda da justiça d´Ele. A tal ponto que estremecia ao ouvir falar dela, mesmo sabendo que ela é adorável. Tal era nela o senso da justiça de Deus, que fazia como os anjos no Céu: velava a face diante dela. Por assim dizer, desviava os olhos da justiça, cuja grandeza tremenda, no entanto, a enchia de admiração.
Não é esta a atitude do relaxado que tem o hábito de pecar, despreza a justiça de Deus, zomba dela, não a teme. Para o relaxado, a meditação sobre a justiça tem um efeito bem diferente do que produzia na alma insondavelmente sensível e delicada de Santa Teresinha. Se temos motivos para achar que não somos tão sensíveis quanto Santa Teresinha em relação à justiça de Deus, nem tão inocentes quanto essa santa carmelita, faremos muito bem em meditar sobre o inferno.
Mais uma objeção que alguém poderia fazer: Eu sou de uma contextura espiritual especial, e lucro mais meditando sobre a bondade de Deus do que sobre o inferno. Respondo que considero esta uma via espiritual legítima, e a respeito inteiramente. Mas tantas vezes o homem é levado a pôr um sofisma assim diante dos olhos, para evitar olhar a justiça de Deus, que o meu conselho é examinar-se muito atentamente antes de admitir essa conclusão.