Faça o leitor um exercício da fantasia, e suponha que lhe fosse possível, revolvendo a série dos séculos já passados, voltar ao tempo de Cristo, e entrar num cômodo da modesta habitação da Sagrada Família em Nazareth. Cuide que encontrasse ali a Virgem brincando com Menino. E que uma e outro fossem exatissimamente como Rouault os imaginou no quadro que reproduzimos em nosso clichê. Esta vista satisfaria a expectativa do leitor? Corresponderia ao que poderia esperar da Mãe de Deus, e do próprio Verbo Encarnado? Encontraria nestas figuras um reflexo autêntico do espírito cristão, das virtudes inefáveis de Jesus e Maria? Evidentemente não.
Quem, pois se empenhe em que a arte cristã reflita de modo digno e apropriado o espírito dos Evangelhos e da Igreja, não pode ser indiferente a que quadros deste gênero se generalizem entre os fiéis. O que acabará por pensar e sentir da Sagrada Família um povo que não tenha diante de si senão obras pictóricas ou escultóricas deste jaez? A arte crista tem a missão de auxiliar dentro de suas possibilidades peculiares a difusão da sã doutrina, e não se pode considerar que o espírito deste quadro seja propício a tal fim.
Para melhor elucidar estas afirmações, consideremos quanto é eficaz pelo contrário este quadro do “Maitre de Moulins”, (século XV), representando também a Virgem e o Menino, para fazer compreender pelos sentidos o que a Igreja nos ensina sobre Jesus e Maria.
- Publicado originalmente na revista “Catolicismo” Nº 06 – Junho de 1951, na seção Ambientes, Costumes e Civilizações.