O normal seria hoje comentar a sórdida corrupção revelada nos últimos dias. Contudo, não será meu foco. Quero falar de um fato alvissareiro.
Do pântano, destaco, porém, um andrajo enlameado que não vi ainda apontado: a indiferença suicida. Antônio Palocci [foto] falou do “pacto de sangue” entre Emílio Odebrecht e Lula. Sponte propria, o dono da empreiteira teria oferecido ao ex-presidente, no intuito de preservar a relação privilegiada da empresa com o governo, pacote que incluía um sítio (presente pessoal), a sede do Instituto Lula, palestras a R$200 mil líquidos, pagos os impostos, além de R$300 milhões, de uso livre, para custear atividades políticas (claro, poderia também cobrir gastos pessoais).15
Em apenas uma das doações, um dos maiores representantes do macrocapitalismo brasileiro pôs R$300 milhões à disposição da propaganda petista. É uma montanha de dinheiro para dar popularidade a programa que acarreta empobrecimento generalizado, atraso e sofrimento para o povo em geral. Clara opção preferencial pela pobreza e pela tirania, como em Cuba e Venezuela, onde, aliás, a Odebrecht financiou generosamente as campanhas de Chávez e Maduro. Ademais, fortalece programa favorecedor do coletivismo e do intervencionismo. Da parte da cúpula da empreiteira, o que se percebe é indiferença total, suicida, com a agressão aos interesses do Brasil, do empresariado e do povo em geral. Passo ao agronegócio. Constato ali, temo que generalizada, a mesma indiferença suicida.
Depoimento de Joesley Batista, um dos maiores pecuaristas, se não o maior, do Brasil: “Ele [Lula] me ligou esses dias, pediu para mim [sic!] atender os sem-terra. Eu digo ‘ô presidente’(risos) ‘Joesley, eu tô aqui com o [João Pedro] Stédile não sei o que ele precisa falar com você …’ ‘Tá bom, presidente, manda ele vir aqui. Eu atendo ele, tá bom’”. No meio do riso, a promessa tácita de financiamento do MST. E o MST iria utilizar o dinheiro, sabia-o Joesley, para agredir os fazendeiros e favorecer o comunismo no Brasil. O mais grave é que não são dois exemplos isolados. São exemplos sintomáticos, são sem-número os casos parecidos na política, na religião, nos negócios, nas escolas. Tal insensibilidade morfética provavelmente constitui a pior ameaça ao nosso futuro de nação próspera, ocidental e cristã.
Falei da Venezuela. A boa notícia vem de lá. O Episcopado, através de suas figuras mais expressivas, está reagindo contra a tirania chavista. E o fato, a reatividade de um organismo vivo, tem importância enorme para a Igreja e para a sociedade.
Cinco bispos, dois dos quais cardeais, solicitaram audiência ao Papa Francisco para expor a grave situação do país. A agenda já estava pronta. Greg Burke, o porta-voz do Vaticano, garantiu que haveria “um rápido cumprimento”. Antes do encontro, já em Bogotá, um dos cinco, Dom Jesús González, bispo-auxiliar de Caracas, declarou publicamente que esperavam ser recebidos. Óbvio, não apenas para “cumprimento rápido”. Após a missa celebrada no Parque Simón Bolívar, em Bogotá, o Papa falou com eles. Melhor talvez, ouviu-os. A delegação era formada, como disse, por dois cardeais, Dom Jorge Urosa, arcebispo de Caracas, Dom Baltazar Porras, arcebispo de Mérida, Dom José Luis Azuaje, bispo de Barinas, Dom Mario Moronta, bispo de San Cristóbal, e Dom Jesús González. A respeito do encontro, a Conferência Episcopal Venezuelana [presidente, Dom Jorge Urosa; vice-presidente, Dom José Luis Azuaje] emitiu comunicado forte e expressivo: “O Pontífice mostrou sua preocupação pela agudização da crise humanitária, manifestada na fome e na escassez de remédios, bem como pela emigração de numerosos venezuelanos. Também foi informado da imposição da Assembleia Nacional Constituinte e da perseguição que alguns dirigentes, ameaças a sacerdotes e religiosas e fechamento de meios de comunicação social”.
De outro lado, pouco antes, na 5ª feira, o arcebispo de Caracas havia denunciado ao diário “El Tiempo”, o principal de Bogotá: “É claro que existe uma ditadura na Venezuela, já que o Parlamento foi anulado. A seguir foi instituído um órgão absolutamente inconstitucional, torpe e fraudulento, a Assembleia Nacional Constituinte. É um sistema ditatorial em que não há divisão de poderes e não se respeitam os direitos fundamentais, ou seja, nem os estabelecidos na Constituição Nacional”.
No quadro da aberta oposição da Conferência Episcopal Venezuelana (CEV) ao governo Maduro, um de seus órgãos, a Comissão Justiça e Paz, em documento assinado por Dom Roberto Lückert León, presidente (antigo arcebispo de Coro), afirma o seguinte: “A Comissão Justiça e Paz, considerando a situação tanto dos presos políticos quanto dos presos comuns, evidenciada nas denúncias de familiares e do Observatório Venezuelano de Prisões, nas quais se descrevem tratamento cruel e desumano nos traslados e nos próprios centros de reclusão, situações anti-higiênicas, alimentação precária, falta de remédios, falta de assistência jurídica, impedimentos para visitas de familiares e falta de assistência médica. Exigimos que cesse a caça às bruxas contra os cidadãos que não pensam como o regime; exigimos que a família do general Raul Isaias Baduel seja informada de seu paradeiro e estado de saúde. Esta comissão eclesial exige o fim da perseguição, da tortura física e psicológica que indica sanha e violência contra tais cidadãos. Exigimos justiça. Caracas, 10 de agosto. Dom Roberto Lückert León, presidente.”
Outro órgão da CEV, a Rede Latino-americana e Caribenha de Migração, assim se manifestou: “Queremos manifestar nossa solidariedade ao povo venezuelano que nesse momento vive uma crise humanitária, caracterizada pela escassez de alimentos e remédios, colapso dos serviços públicos, inflação mais alta do mundo, violência sem limites e graves violações dos direitos humanos. A Conferência Episcopal Venezuelana assinalou profeticamente: ‘Em nosso país se percebe de forma muito clara como a violência adquiriu caráter estrutural. São muitas suas expressões’. Esta situação que atenta contra a vida e a dignidade dos venezuelanos e venezuelanas, forçou milhares e milhares a deixar o país, em diáspora sem precedentes”.
Cada um — sem nenhuma indiferença, que no caso teria uma nota suicida —, em seu respectivo âmbito precisa ajudar a Venezuela enfraquecida a sair do abismo, no momento em que forças poderosas a empurram para mais fundo. Rússia, China, Nicarágua, Bolívia, assim como o PT e vários partidos de esquerda no Brasil trabalham a favor da clara opção preferencial pela tirania e pela fome na Venezuela. É gravíssimo. Um lembrete. Temos aqui ótima ocasião para que a CNBB, abandonando sua conduta de dócil companheira de viagem das causas da esquerda, apoie com força sua brava coirmã, a CEV. Exposta ao perigo, increpando exclusões, a CEV leva adiante uma cruzada em defesa do povo humilde e da nação perseguida. A mudança de rumos, tomara, será sintoma de que, por fim, a CNBB começou a ouvir os clamores do povo. O bom exemplo edificaria a todos os brasileiros.