Em alguma medida, muitos dos conhecimentos que nos são transmitidos pela natureza podem explicar o mistério da ressurreição da carne. Por exemplo, o nascer e o pôr do sol; o pintainho que sai do ovo; a crisálida — uma imagem do homem no túmulo — onde a borboleta atinge os seus dias antes de se lançar aos ares, reflete o homem ressuscitado. Tais símbolos foram criados por Deus para que o homem os contemple e admita uma verdade transcendente que é a ressurreição final.
Com efeito, ao ressuscitar, Cristo nos deu prova insofismável de sua divindade, confirmando-nos na fé, fortalecendo-nos na esperança, conduzindo-nos a uma vida mais perfeita, como afirma o Apóstolo São Paulo quando nos convida a renunciar ao velho fermento, que é o “fermento da malícia e da corrupção”. Se já ressuscitastes com Cristo, procurai as coisas do alto e afeiçoai-vos às coisas do Céu, não mais às da Terra.
O corpo de Cristo ressuscitado foi o mesmo que pendeu na cruz, e retirado do madeiro foi depositado no sepulcro pelo seus discípulos. No momento mesmo em que Jesus Cristo ressurgiu dos mortos, seu corpo ressurreto possuía os dons gloriosos da impassibilidade, da sutileza, da agilidade e da claridade, reflexos do transbordamento da glória da alma em liberdade, em que o corpo participa de todas essas qualidades.
Por que Cristo ressuscitou gloriosamente? Porque a sua ressurreição foi exemplar e a causa da nossa. Os santos, ao ressurgirem, terão seus corpos glorificados, como diz o Apóstolo, pois semearam na tristeza e ressuscitarão em glória. Se Cristo Nosso Senhor, submetido a todas aquelas humilhações da paixão e morte, mereceu glória incomparável, foi para brilhar aos olhos de todos aqueles que um dia ressuscitarão na mesma glória.
Sabemos pela teologia que a alma de Cristo — desde o primeiro instante de sua concepção — vivia em perfeita contemplação da divindade, vendo Deus face a face. Para que Cristo pudesse redimir o gênero humano, foi necessária como que uma interrupção desta visão, a fim de evitar que as alegrias decorrentes dela em sua alma não inundassem o seu próprio corpo mortal. Foram como que suspensos os benefícios da contemplação beatífica.
Exceção houve na transfiguração ocorrida no monte Tabor (afresco ao lado), quando os Apóstolos puderam contemplar a divindade de Jesus Cristo: “Não conteis a ninguém o que vistes e ouvistes, até que o Filho do Homem ressuscite dos mortos”. O corpo de Nosso Senhor foi tomado de um esplendor que superou a luz do sol, pois o Filho de Deus, que havia assumido a humanidade enquanto Deus, não reteve nem impediu que sua divindade se refletisse em seu corpo.
Quando apareceu aos Apóstolos — afirma Santo Tomás de Aquino —, Ele agia à maneira de recipiente, emanando a auréola de seu corpo glorificado que se funde à cor natural do corpo humano, assim como o vidro colorido se torna resplandecente pela iluminação do sol, independendo de sua cor. Cristo quis aparecer aos seus discípulos com a sua cor natural, para que assim eles pudessem contemplá-Lo e serem confirmados na fé.
Assim como apareceu aos seus discípulos — diz a Sagrada Escritura —, Cristo desvaneceu-se aos olhos deles pelo dom da agilidade. Por esse dom Ele podia desaparecer, estando ainda presente ou separando-se e pondo-se em outro lugar com a rapidez do pensamento, assim como pela sutileza, que Lhe era intrínseca, pôde transpor a pedra do túmulo que O continha e a porta fechada do Cenáculo, onde se encontravam os discípulos reunidos.
Ora, todos esses acontecimentos depois da ressurreição de Cristo se deram — a exemplo das cicatrizes conservadas em suas divinas mãos e pés, bem como a do lado trespassado pela lança de Longino — para demonstrar que aquele era o mesmo Cristo que havia sido crucificado, morto, sepultado e que ali se encontrava vivo, glorioso e impassível, vencedor da morte e do pecado para a glória do Pai e do seu santo Nome.
Tornou esplendorosa a justiça de Deus por meio da obediência, que O levou a ser desprezado e objeto de opróbio pelo populacho — “Humilhou-se a si mesmo, fez-se obediente até à morte e morte de Cruz, pelo que Deus também O exaltou, e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes” (Fil. II 7-9).
Essa foi a gloriosa trajetória que Jesus Cristo quis percorrer para nos fazer ressurgir do pecado mortal — que é a morte da alma — para a vida da graça, por meio da penitência, sem protelação, prontamente, como Cristo ressurgiu ao terceiro dia. E com o firme e perseverante propósito de não mais pecar, com resolução de evitar tudo o que antes fora ocasião de morte e de pecado, vida nova e de justiça em ordem à vida eterna. Eis uma lição da ressurreição gloriosa de Nosso Senhor Jesus Cristo.
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(*) Sacerdote da Igreja do Imaculado Coração de Maria – Cardoso Moreira (RJ).