Santo Antonio: “Arca do Testamento” e “Martelo dos Hereges”

6

(Conferência de 12/6/65)

Santo Antônio, cf. representação de Giotto ( Legenda de São Franciso - Aparição de Arles - detalhe )
Giotto – Legend of St Francis: Apparition at Arles – 1297-1300 – Fresco, Upper Church, San Francesco, Assis

Hoje é festa de Santo Antônio de Pádua, Confessor e Doutor da Igreja. Chamado “Arca do Testamento” e “Martelo dos Hereges”, franciscano. Século XIII.

Neste dia a[s] igreja[s] [d]e todas as nações, do Ocidente pelo menos, encheram-se de fiéis e, amanhã ainda especialmente, que vão comemorar a festa de Santo Antônio e por toda parte as imagens de Santo Antônio estão sendo expostas para objeto de veneração dos fiéis.

Este fato me lembra que estando em 1950 em Assis, eu tive ocasião de me documentar a respeito de como era Santo Antônio. E ali se mostra, na Basílica de Assis, um quadro pintado por Giotto, que passa por ser o quadro mais próximo, mais provavelmente representativo da pessoa de Santo Antônio. E se trata de uma pessoa de corpo hercúleo, de pescoço taurino, forte, de expressão de fisionomia séria, de olhar imperioso e majestoso, e numa atitude assim [… inaudível] as pessoas, como Doutor da Igreja que ele era. Comprei então algumas fotografias dessa imagem.

Ao mesmo tempo, comprei uma pilha de estampas iguais que eram vendidas às pessoas que iam à igreja também, e que representavam Santo Antônio, não de acordo com a probabilidade histórica do quadro de Giotto, mas de acordo com uma concepção que figura nas imagens comuns. Então, um homenzinho imberbe, coradinho, com o Menino Jesus no braço, com um ar de quem não entende muito o que está fazendo com o Menino Jesus no braço; o Menino Jesus também com uma cara de quem não entende muito o que está fazendo no braço de Santo Antônio, sorrindo os dois um para o outro como que dizendo: desculpe, aqui deve haver algum equívoco.

Santo Antônio - Iconografia eivada de sentimentalismo
Santo Antonio – iconografia eivada de sentimentalismo

Na fisionomia de Santo Antônio, nada que falasse no Doutor da Igreja, nada que representasse o homem que era tido como o maior conhecedor do Novo e Antigo Testamento, – as Sagradas Escrituras, – no tempo dele, porque conhecia as passagens mais raras, mais excepcionais, mais ignotas de todas e tirava delas efeitos de pregação extraordinários. E Santo Antônio, conhecido como o “Martelo dos Hereges”, como polemista, como homem que era capaz de discutir – não de “dialogar” (no sentido irenístico do termo *) – era capaz de entrar em debate com os hereges, de achatá-los – não havia ninguém como ele – e ainda coberto com os milagres que completavam sua pregação e faziam com que fosse o terror dos hereges.

O verdadeiro Santo Antônio histórico, e como é apontado pela Igreja para nosso modelo, portanto como o é no céu, desapareceu quase completamente. É uma figura física que nada tem a ver com ele, nada tem a ver sobretudo com sua fisionomia moral.

Santo Antônio, além de ser o “Martelo dos Hereges” e a “Arca do Testamento”, é venerado como o Patrono das Forças Armadas. E a razão disso – entre outros fatos – está em que Santo Antônio, em certa ocasião, foi objeto de um ato de devoção especial da parte de um almirante espanhol. Uma esquadra espanhola sitiava a cidade de Orán e não havia meio de conseguir resultado eficaz. Então, o almirante espanhol dirigiu-se a uma imagem de Santo Antônio, colocou o chapéu de almirante sobre a imagem, deu-lhe as insígnias de comando e pediu-lhe que investisse [contra] Orán. Os mouros fugiram inesperadamente e interrogados, disseram que tinha estado entre eles um frade vestido com o chapéu do almirante e que tinha ameaçado Orán com o fogo de céu, e que por causa disso eles tinham achado mais prudente ir embora. Quer dizer, este aspecto do “Martelo dos Hereges” que ao mesmo tempo incute terror aos mouros e que se apresenta a uma cidade infiel e a ameaça com o fogo do céu, todo esse aspecto foi abolido.

Santo Antônio com as insígnias de Capitão de Infantaria
S. Antônio com as insígnias de Capitão de Infantaria (**

Aí vemos a lamentável deterioração da devoção aos santos em nossos dias. Quer dizer, como eles já não representam, na legenda  que em torno deles se criou, a verdadeira santidade. Quem, por exemplo, comentará a respeito da vida de Santo Antônio, este fato que se deu no Rio de Janeiro e que foi o seguinte: o Rio de Janeiro estava sendo cercado pelos calvinistas franceses e já estava quase completamente rendido e a cidade não tinha meios de resistir. Os frades então tomaram a imagem de Santo Antônio, desceram com ela o morro, colocaram numa pilastra que se encontrava ali e a simples exibição da imagem, de um modo maravilhoso comunicou tal ardor na cidade, que grande número de jovens se alistaram, sendo possível reorganizar a resistência aos franceses e os franceses, depois de pouco tempo, foram embora. De maneira que o Rio de Janeiro não se tornou calvinista e talvez com repercussão em toda a História da América Latina, e portanto em toda a História da Igreja, por causa dessa ação simbólica de presença maravilhosa de Santo Antônio.

Todas essas são coisas que não se dizem, não se contam, não se comentam e os senhores podem, através disso, verificar duas coisas: em primeiro lugar, como é lamentável esta torção que a vida dos santos sofreu.

Mas, por outro lado, também, como é admirável lutar para restaurar todas essas coisas e mostrar os próprios santos no seu aspecto combativo, no seu aspecto guerreiro, no seu aspecto polêmico, no seu aspecto contra-revolucionário, que a Revolução tanto gosta de esconder e de disfarçar.

___________________

(*) O Prof. Plinio aqui se refere a um conceito irenístico do termo “diálogo”, como magistralmente descrito em sua obra “Diálogo e baldeação ideológica inadvertida”, cuja leitura recomendamos a nossos visitantes.

(**) S. Antônio com as insígnias de Capitão de Infantaria: “Santo Antonio, cuja imagem esteve colocada na muralha do Convento, defendeu o Rio de Janeiro contra os franceses, o que lhe valeu a patente de Capitão de Infantaria”. ( “Santo Antônio – vida, milagres, culto”, pgs. 144-146, Frei Basílio Röwer )

Artigo anteriorMarcha das Vadias
Próximo artigoTer nojo é coisa boa?
Homem de fé, de pensamento, de luta e de ação, Plinio Corrêa de Oliveira (1908-1995) foi o fundador da TFP brasileira. Nele se inspiraram diversas organizações em dezenas de países, nos cinco continentes, principalmente as Associações em Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP), que formam hoje a mais vasta rede de associações de inspiração católica dedicadas a combater o processo revolucionário que investe contra a Civilização Cristã. Ao longo de quase todo o século XX, Plinio Corrêa de Oliveira defendeu o Papado, a Igreja e o Ocidente Cristão contra os totalitarismos nazista e comunista, contra a influência deletéria do "american way of life", contra o processo de "autodemolição" da Igreja e tantas outras tentativas de destruição da Civilização Cristã. Considerado um dos maiores pensadores católicos da atualidade, foi descrito pelo renomado professor italiano Roberto de Mattei como o "Cruzado do Século XX".

6 COMENTÁRIOS

  1. IMAGINEMOS SE S ANTONIO ESTIVESSE AQUI HOJE E O DOUTRINARIO COMUNISTA PROLIFERANDO, QUE NÃO FARIA PARA EXTERMINÁ-LO!
    O SOCIALISMO/COMUNISMO É UMA FILOSOFIA DO FRACASSO, O CREDO DA IGNORANCIA E O EVANGELHO DA INVEJA” – Winston Churchill
    50 ANOS DA FRACASSADA E MISERÁVEL CUBA É O PRIMORDIAL EXEMPLO!
    O Comunismo/socialismo é uma bandidagem legitimada pela força ou por meios pseudo-democráticos, em geral fraudulentamente imposto. O comunismo nasceu no espírito invejoso dos piores, dos miseráveis em todos os aspectos, dos ressentidos e fracos. Veio dos que vivem a olhar para o que os outros têem e eles não, produzindo e sedimentando a inveja, relembrando o episódio bíblico do invejoso Caim, assassinando para se apossar de bens.
    É filho do espírito de rebanho, porque é coletivista e os Comunistas precisam sempre agir em “bando”, pois são individualmente fracos, valendo-se da truculência, não sabendo argumentar: só impor. E os pastores para o tal rebanho são os intelectuais de extrema esquerda, única função que pode dar a eles “poder” em suas vazias existências, suprindo-o com o status político e financeiro.
    Daí, conduzir o rebanho de fracos e ressentidos é um ótimo negócio para esses pastores. Centenas de milhões de “crentes” em Marx crêem não no que ele cria, mas no que ele queria, sempre crescem em número de sua patológica inveja .
    São cabeças de aluguel, gente que para obter algum sentido de vida se entregou à mentira, escravizou sua mente, aboliu grande parte da sua própria liberdade de pensamento, estando hoje sob a rédeas da cupidez de bens alheios: tomar dos outros e os repassar a si e ao partido, sem temores ou constrangimento; ser comunista é dar atestado público de ser plenamente inescrupuloso.
    Milhões de livros, artigos e entrevistas são uma loucura em que seus autores consentiram em crer, ou uma mentira que julgaram apropriado contar doutrinando de como se apossar de bens alheios e se tornar poderoso via farsas de proteger os pobres!

  2. Infelizmente o grande Doutor da Igreja e pregador é lembrado apenas como o santo casamenteiro e incentivador de supersticiosas simpatias. Suas imagens mostram um homem de feições muito delicadas. É por isto que a juventudade de hoje, principalmente os rapazes tem aversão as imagens dos santos. Não transmitem a fortaleza cristã da quel eles erem revestidos.

  3. FOI MUITO INSTRUTIVO LER ESTE ARTIGO SOBRE SANTO ANTONIO QUE MUITO ADMIRO, E PASSAREI A ADMIRAR MAIS AINDA, VOU BUSCAR MAIS A RESPEITO DELE.

  4. Santo Antônio! Santo Antônio! Santo Antônio! Casamenteiro para desencaiar beatas, será? É o que vem na memória, com fogueiras, barraquinhas quentão e quadrilhas. Uma tradição inoculada e enraizada na cultura popular. Tenho o manual de Santo Antônio muito antigo que era de meu pai, da década trinta. Rezo suas orações diariamente. E é muito gostoso, reler seus milagres; entre tantos, devo relembrar o milagre da Hóstia, que fez com que um jumento de um herege, depois de ter ficado vários dias sem comida, foi posto como prova da presença Real de Nosso Senhor na Hóstia Consagrada. E ao passar Santo Antônio em procissão, o herege põe uma gamela de milho para o animal, e para a surpresa de todos e do incauto, o jumento ao ver passar o Santíssimo Sacramento se inclinou com as patas dianteiras, numa reverente atitude de adoração sem si quer tocar no alimento até que passasse O Senhor Eucarístico trazido por Santo Antônio, e depois voltando para gamelo começou a comer o alimento tranquilamente. E tantos outros acontecimentos; dos peixes, do rico avarento falecido, cujo coração foi mostrado pelo Santo dentro do baú de seus tesouros. É!!!!!!!!!!! na situação atual, o que diria Santo Antônio? Com certeza teria uma mensagem de conforto e incentivo a continuar sendo cada vez mais santos para os bons, e um martelo terrível para os hereges, infiéis e incrédulos.
    Santo Antônio, rogai por nós!
    Salve Maria!

  5. Eu, amei este texto!
    Sou devota de Santo Antônio de Pádua, (Lisboa). E conheço sua história verdadeira, por livros e publicações adquiridas em duas Comunidades Paroquiais, que o Veneram como Santo Padroeiro, daqui de Porto Alegre.
    Este texto, faz jus ao verdadeiro valor e papel de Santo Antônio, na Igreja Católica. E a maioria das pessoas nem o conhecem assim.
    Vou publicá-lo no Facebook, para que meus amigos saibam de sua importância.
    Dizem os entendidos que ele, é considerado pela Igreja o Santo mais completo e melhor posicionado na escala de santidade. Assim que puder, colocarei estas prerrogativas, tb, no Facebook.
    Obrigada, ao Instituto Plínio Corrêa de Oliveira!
    E, um feliz dia de Santo Antônio, (mesmo que atrasado).

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui