São Miguel Febres Cordero Muñoz

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Comemoramos neste mês o primeiro santo equatoriano, falecido em 1910. Da Congregação dos Irmãos de La Salle, foi confessor, teólogo, filósofo, filólogo, literato, poeta e grande educador. Sua festividade é celebrada neste dia 9 de fevereiro.

  • Plinio Maria Solimeo

Chamados pelo grande presidente católico Gabriel Garcia Moreno, em 1863 chegaram ao Equador os Irmãos das Escolas Cristãs, ou de La Salle. Esse intrépido mandatário, que foi assassinado pela maçonaria pouco tempo depois de consagrar seu país ao Sagrado Coração de Jesus, introduziu no Equador várias congregações religiosas para o ensino da juventude de ambos os sexos.

Fundados por São João Batista de La Salle — reformador e pai da moderna pedagogia, que visava dar uma educação católica à juventude masculina pelo cultivo do espírito de fé, piedade, mortificação e obediência —, os dez primeiros membros dos Irmãos das Escolas Cristãs se estabeleceram nas cidades de Quito, Guayaquil e Cuenca.

Sofrimento desde o berço

Francisco Luís Febres-Cordero y Muñoz, ou Panchito (diminutivo de Francisco) nasceu no ano de 1854 — o mesmo da proclamação do dogma da Imaculada Conceição — em Cuenca, de família nobre e de forte tradição católica. Seu avô era general do exército, venerado como herói nacional, e seu pai, Francisco María Febres-Cordero y Montoya, professor universitário, lecionando francês e inglês no seminário da cidade. A mãe, Ana de Jesus Muñoz y Cardenas, era uma devota católica ativamente dedicada às obras de caridade.

Panchito conheceu o sofrimento desde pequeno, pois nasceu com as pernas deformadas, só dando os primeiros passos aos cinco anos, graças a um acontecimento sobrenatural: a aparição de Nossa Senhora do Manto Azul, na roseira do jardim de sua casa. Aos oito anos foi milagrosamente salvo de ser massacrado por um touro selvagem.

Dona Ana cuidou da educação religiosa do filho até falecer, quando ele tinha apenas nove anos. Seu marido casou-se então com Heloísa Santillán, que tratou Panchito como filho e lhe deu um meio-irmão chamado Benjamin.

Em 1863 Panchito foi um dos primeiros alunos da escola dos Irmãos de La Salle na cidade. Muito dotado, escolheram-no para fazer o discurso de boas-vindas ao presidente-mártir, Gabriel Garcia Moreno, quando este visitou a escola.

No contato com os religiosos, o menino começou a sentir o atrativo para o serviço de Deus. Admirando a vocação de seus professores, quis ser um deles. Mas seu pai, embora bom católico, não quis saber disso, pois ambicionava posição mais honrosa para o filho, de acordo com a alta posição da família. Toleraria até que ele se fizesse sacerdote, pois poderia fazer carreira a serviço da Igreja, chegando mesmo a bispo, mas não um simples Irmão, sem futuro que o de um mero professor.

Matriculou-o então no Seminário diocesano. Mas o adolescente não se adaptou àquela vida, adoeceu, e teve de voltar para casa. Como sua saúde continuava piorando, seu pai concordou que voltasse para a escola dos Lassalistas.

Irmão Lassalista aos 14 anos

Como Panchito não abandonava a ideia de se fazer religioso, persistindo em querer entrar para o Instituto, finalmente seu pai, muito a contragosto, lhe deu a permissão.

Foi assim que, com apenas 14 anos, Francisco ingressou em 1868 no Instituto de La Salle, sendo o primeiro equatoriano a fazê-lo. Cumpre dizer que sua relação com o pai foi desde então bastante tensa. Mas se reconciliaram antes que ele morresse, em 1882.

Francisco recebeu o hábito religioso na véspera da festa da Anunciação, tomando o nome de Miguel. Como não havia noviciado em Cuenca, ele iniciou sua vida religiosa na própria comunidade do colégio daquela cidade.

O Irmão Miguel era um prodígio de saber, lecionando em Quito a partir dos 15 anos, o que ele fez durante mais de três décadas, de 1869 a 1901. Como educador, tornou-se logo conhecido pela gentileza e dedicação. Segundo a tradição do colégio, era incomparável como gramático e filólogo, mas sem falsa erudição. Zeloso catequista, ele se tornava criança entre as crianças que preparava para a Primeira Comunhão.

Governo adota seus livros didáticos

O Irmão Miguel era um escritor nato. Compôs seu primeiro livro aos 20 anos, ao qual se seguiram gramáticas, manuais de geografia, história, religião e literatura, para uso no colégio. Escreveu inclusive um manual para o ensino do espanhol. Sobressaiu-se como poeta, cantando as glórias de Maria Santíssima. O governo equatoriano adotou alguns de seus livros didáticos, que passaram a circular nas escolas do país. Ele também pesquisou e escreveu livros sobre literatura e linguística, o que lhe rendeu ser nomeado por unanimidade membro da Academia Equatoriana de Letras em 1892, seguindo-se as Academias da Espanha, da França e da Venezuela. Dirigiu retiros religiosos e foi diretor da casa de sua Congregação de 1901 a 1904.

Em 1888 o Irmão Miguel foi escolhido para assistir em Roma à beatificação de São João Batista de La Salle, fundador da Congregação dos Irmãos das Escolas Cristãs. Teve então oportunidade de venerar com emoção as inúmeras relíquias da Cidade Santa e o Santuário de Nossa Senhora de Loreto.

Mestre de Noviços

De volta ao Equador, continuou seu trabalho como professor de espanhol e literatura. Tornou-se então mestre de noviços de 1896 a 1905, função na qual formava com prudência os jovens que se juntaram à Congregação no ambiente político tumultuado dos regimes cambiantes do país. Foi também eleito diretor da escola da Sagrada Família, mas logo deixou o cargo por não ser um grande administrador.

Entretanto, seus talentos na formação dos irmãos mais novos e nos trabalhos acadêmicos chamaram a atenção dos responsáveis ​​pelo Instituto em Roma. Enviaram-no então em 1905 à Europa, a fim de que traduzisse textos do francês para o espanhol, para uso do Instituto.

O Irmão Miguel chegou à França em um momento de grande agitação civil e perseguição religiosa. Em março de 1907 foi designado para Paris, e em julho desse mesmo ano, para a Casa Mãe em Lembecq-lez-Hal, perto de Bruxelas, na Bélgica.

A igreja de Nossa Senhora do Carmo em Barcelona, após a “semana trágica” de 1909.

“La semana trágica”

Em 1908, com a saúde fragilizada por uma persistente pneumonia, foi transferido para uma escola perto de Barcelona, na Espanha. Ainda estava nessa cidade ​quando houve, no verão de 1909, uma semana de convulsão social conhecida como “la semana trágica”.

Esse nome é usado para designar os sangrentos acontecimentos ocorridos em Barcelona e outras cidades da Catalunha de 26 de julho a 2 de agosto de 1909, com o enfrentamento entre o exército e a classe operária apoiada por anarquistassocialistas e republicanos. Milhares de pessoas foram detidas, processadas ou desterradas, 59 condenadas à cadeia perpétua e cinco executadas.

Durante essa semana, igrejas foram queimadas e sacerdotes perseguidos em todas as cidades. Apesar disso, a casa dos Irmãos foi milagrosamente preservada, o que muitos creditam à imagem da Santíssima Virgem colocada pelo Irmão Miguel em uma janela do edifício. Os Irmãos puderam então voltar com segurança para a cidade. Entretanto, o incidente afetou muito a saúde já combalida do futuro santo.

Relíquias do Santo

Falecimento e glorificação

O Irmão Miguel continuou trabalhando conscienciosamente e com espírito sobrenatural enquanto a saúde lhe permitiu. Cada vez mais debilitado, foi-se apagando, vindo a falecer no dia 9 de fevereiro, durante o rigoroso inverno de 1910, na cidade de Del Estragar, onde foi sepultado.

Quando a notícia chegou aos católicos do Equador, estes lamentaram muito a perda de seu amado herói.

Em 1937, devido às dessacralizações, perseguições e martírios de sacerdotes e leigos católicos, perpetrados pelos comunistas durante a feroz Guerra Civil Espanhola, seu corpo incorrupto foi devolvido ao seu país natal, sendo recebido com honras de herói nacional.

Amado como modelo de religioso e de santo, foi enterrado em Quito, cidade em que passou a maior parte de sua vida e onde seu túmulo se tornou um local de peregrinação popular.

Sua fama de santidade o acompanhou durante toda sua vida, crescendo após sua morte. Declarado Venerável por Paulo VI, que também o beatificou em 30 de outubro de 1977.

Quase uma década depois, em 21 de outubro de 1984, João Paulo II finalmente o canonizou como o primeiro santo equatoriano. Seu sobrinho- bisneto, o então presidente do Equador, León Febres Cordero, esteve presente à canonização de seu ilustre tio.

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Fontes:

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