Desde as origens mais remotas da civilização, a justiça é um dos pilares sobre os quais repousa a ordem temporal. Sem ela não é possível viver em paz e harmonia, nem há condições para um verdadeiro progresso. Quando erradicada da ordem social, ausenta-se também um dos pressupostos fundamentais da paz, porque uma nação sem justiça caminha rumo ao caos social. E aqueles que buscam a verdadeira paz devem estabelecer em primeiro lugar um sistema justo que dê a cada qual aquilo que merece, e puna os que delinquem na mesma proporção do dano deliberado que fazem ao próximo.
Estas considerações um pouco filosóficas são de absoluta atualidade na Colômbia. Terminou um longo “processo de paz” promovido pelo governo anterior de Juan Manuel Santos, que longe de unir o país em torno do que supostamente se buscava — a paz —, fragmentou-o em mil pedaços. E a anunciada paz ainda não apareceu em nenhum lugar.
A Colômbia acabou aceitando muitos absurdos da negociação com as FARC (Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia). Por exemplo, os guerrilheiros não entregaram todas as armas, nem as rotas do narcotráfico, nem os cultivos ilícitos de cocaína, nem a grande fortuna ilegal que acumularam durante muitos anos. E menos ainda contaram a verdade sobre todos seus crimes. Eles zombaram do país e do mundo, pois apesar dos benefícios não merecidos que auferiram, continuam com a luta armada através de dissidências e organizações criminosas paralelas.
Quanto à justiça que deveria ser aplicada aos guerrilheiros que demoliram Colômbia durante décadas, tem havido uma razão de discórdia e de escândalo que aumenta a cada dia. No Acordo final estabeleceu-se a criação de um tribunal de justiça alternativa, chamado Jurisdição Especial para a Paz (JEP), dotado de amplos poderes para julgar todos os envolvidos nos crimes cometidos pela subversão até antes de 1º de dezembro de 2016, data em que o “Acordo” entrou em vigor, pois os crimes perpetrados posteriormente já não podem ser protegidos por qualquer anistia. Para esses criminosos, culpados de crimes de lesa-humanidade — como assassinato, sequestro, terrorismo, abuso sexual de menores etc. — aplicar-se-ão penas alternativas, algumas delas risíveis.
Bem, é isso que o “acordo” diz. No entanto, o que na realidade está acontecendo é algo completamente diferente. Em seus poucos meses de operação, a JEP se tornou uma roda solta que concede indultos de modo indiscriminado, liberta os piores criminosos e lhes permite deixar o país sob o pretexto de tirar férias. Até o momento não fez nenhum julgamento sério, nem condenou ninguém a um único dia de prisão. Com este procedimento, a JEP abriu as comportas da impunidade mais escandalosa, e aquilo que o “Acordo” com as FARC chama de “penas alternativas” se tornou um escárnio grotesco.
O presidente Duque não cumpre suas promessas eleitorais
Um dos temas mais candentes e polêmicos durante a última campanha presidencial foi o “Acordo” com as FARC. Enquanto candidato em busca devotos do eleitorado, o presidente Ivan Duque era um acérrimo crítico do “Acordo”: denunciou corajosamente os destemperos JEP e prometeu a seus eleitores que se eleito suprimiria esse monstro de mil cabeças. Seu partido, o Centro Democrático, fez uma ótima campanha anunciando o mesmo, tendo sido essa a plataforma com a qual as eleições foram ganhas. E o mentor de ambos e diretor do partido, o ex-presidente Álvaro Uribe, também foi apresentado na época como grande opositor do JEP e do “Acordo” com as FARC.
No entanto, uma vez ganhas as eleições, o presidente Duque, o Centro Democrático e o Dr. Uribe se esqueceram de seus compromissos e acabaram apoiando a integridade do “Acordo”. Agora eles não dizem uma única palavra contra a impunidade que tanto atacaram durante a campanha presidencial, nem contra as decisões antijurídicas do JEP, nem muito menos contra a demolição da ordem jurídica da Nação, contida no “Acordo” com as FARC.
A Colômbia exige uma explicação ante este procedimento!
Além disso, cumpre lembrar que em outubro de 2016 houve um plebiscito para referendar esse “Acordo”, cujo resultado foi a favor do NÃO. Os colombianos o rejeitaram porque já naquela data estava evidente a artimanha do governo de Santos e das FARC para destruir a ordem constitucional do país. Essa evidência não fez desde então se não crescer e se tornou agora um grande escândalo. A realidade é que o “Acordo” foi uma rendição do Estado às FARC, grupo terrorista que continua a cometer crimes protegido pela mais absoluta impunidade graças ao JEP, cuja atuação corre agora sob a responsabilidade do atual governo.
Tudo isso vem ao caso a propósito da polêmica suscitada nesses dias pela promulgação do Estatuto de Funções do JEP, aprovado pela própria instituição, endossado pelo Tribunal Constitucional, e que deverá agora ser também aprovado pelo Presidente da República. Este último tem o direito de se opor, no todo ou em parte, e deve fazê-lo, se for consistente com as declarações feitas durante a campanha eleitoral. Desta forma poderiam ser corrigidos os erros que deram origem a esse organismo perverso, estabelecendo limites a suas competências, embora o mais benéfico para a Colômbia fosse suprimi-lo. Mas, caso o presidente não faça qualquer objeção, ficará mais uma vez comprovado que os primeiros mandatários são eleitos graças a um programa e a umas promessas de governo, e acabam fazendo o oposto, traindo seus eleitores e escarnecendo deles.
Após a assinatura do “Acordo” com as FARC — fraudulentamente recompensado pela outorga do Prêmio Nobel da Paz ao então presidente Santos —, a anunciada pacificação do País foi o que os colombianos menos vimos. A cada dia que passa, torna-se mais evidente que estamos diante de uma das maiores fraudes da nossa história, que todo esse processo foi uma mentira projetada por Santos, as FARC e o governo de Cuba para destruir a Colômbia e entregá-la aos defensores do marxismo fracassado, miserável e faminto ainda existente no mundo.
Nessa fraude feita à Colômbia o JEP exerce o principal protagonismo. Ele representa tudo o que os colombianos não querem, contra o qual eles votaram no plebiscito, e que por isso mesmo os levaram a eleger o atual presidente. E se as rédeas não forem ajustadas, será mais um elemento de descrédito para o atual governo.
Post Scriptum: Este artigo já estava concluído quando explodiu a notícia de que um dos promotores do JEP foi preso no dia 1º de março em um luxuoso hotel de Bogotá enquanto recebiaum suborno de US $ 500.000 para torpedear a extradição de Jesus Santrich |foto| para os EUA. Este terrorista das FARC está preso há mais de um ano, por negócios milionários de venda de cocaína realizados após a data em que gozava de impunidade, e o JEP se recusa a autorizar sua extradição ante os insistentes pedidos do Departamento de Justiça dos EUA. Fato muito sério, que enlameia ainda mais o JEP.
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(*) O autor é diretor da Sociedad Colombiana de Tradición y Acción.