No século XVI Deus Nosso Senhor suscitou várias Ordens religiosas para fazer frente à heresia protestante e aos efeitos perniciosos do Renascimento. Uma delas foi a dos Clérigos Regulares Mínimos, fundada por São Francisco Caracciolo e pelo venerável João Agostinho Adorno, para o cuidado das paróquias, com seus membros levando uma vida conventual.
Ascânio Caracciolo nasceu no dia 13 de outubro de 1563 em Vila Santa Maria, no reino de Nápoles, numa ilustre família da nobreza local. Desde pequeno destacou-se por sua suma gentileza, retidão, amor à penitência, terna devoção à Santíssima Virgem, e amor aos pobres. Tão logo aprendeu a ler, começou a rezar diariamente o Pequeno Ofício de Nossa Senhora e o terço, e a jejuar aos sábados em sua honra.
Na adolescência Ascânio, para ocupar seu tempo de maneira a evitar a ociosidade, dedicou-se à caça e a outros exercícios corporais como modo de cansar o corpo para vencer a concupiscência da carne, e manter ilibada sua pureza.
Entretanto, não havia ainda escolhido um estado de vida quando, aos vinte e dois anos de idade, contraiu violenta lepra, que lhe provocou uma chaga no estômago que o pôs em risco de vida. Ascânio sentiu na própria pele quão frágil e efêmera é a vida, e pensou na eternidade.
Prometeu então a Deus Nosso Senhor que, se ele sarasse, consagrar-lhe-ia o resto de seus dias. Esse era o beneplácito divino, pois ele foi curado milagrosamente e com tanta prontidão e eficácia, que não lhe restou no corpo nenhuma marca da mortal doença.
Ascânio comunicou então a seus pais sua resolução e, de posse de sua parte da herança paterna, a distribuiu aos pobres, indo para Nápoles para principiar os estudos eclesiásticos. Em 1587, ajudado por sua brilhante inteligência e aplicação, foi ordenado sacerdote.
Havia então em Nápoles uma benemérita confraria chamada dos “Penitentes Brancos”, cujos membros se ocupavam particularmente de preparar para a morte os condenados, em auxiliar espiritual e materialmente os cativos e condenados às galés, e em evangelizar os pobres e os necessitados. O santo nela ingressou, dedicando a ela, até o fim de seus dias, parte de seu tempo e de seu apostolado.
Entretanto o Pe. Ascânio suplicava muito a Deus que o fizesse conhecer o que dele queria, pois sentia que ainda não tinha encontrado sua verdadeira vocação. Ocorreu então que, num dia de 1588, ele recebeu uma carta que iria mudar sua vida. Com efeito, ela convidava o destinatário para ir à residência de outro sacerdote para tratar de importante negócio. Lá o santo encontrou o Pe. João Agostinho Adorno, de ilustre família de Gênova, que tinha abandonado o mundo, e desejava fundar nova Ordem religiosa unindo a vida ativa à contemplativa.
O que é mais extraordinário é que a carta fora dirigida a um outro destinatário homônimo do santo, e fora por engano entregue a ele. Os três sacerdotes viram nisso a mão da Providência, tanto mais que o santo interessou-se muito pelo projeto e quis dele participar.
Ascânio e Agostinho dirigiram-se então para uma camáldula perto de Nápoles para, no recolhimento e na oração, amadurecerem o projeto. Para alcançar as bênçãos de Deus, estabeleceram um turno de penitências entre os dois, de maneira que, enquanto um jejuava a pão e água, o outro tomava a disciplina. Surgiram assim os Clérigos Regulares Menores, para maior glória da Igreja.
A nova congregação levava vida contemplativa e ativa e, além dos três votos usuais de obediência, pobreza e castidade, acrescentavam um quarto que era o de seus membros nunca aspirarem às dignidades eclesiásticas fora da Ordem, nem de procurá-la dentro dela.
Os dois fundadores encontraram logo muitos seguidores. Pois essa instituição de Clérigos Regulares se tornou tão bem sucedida e popular porque bem adaptada às modernas necessidades da Igreja, que seu modo de vida foi escolhido como modelo para várias outras comunidades de homens, quer religiosos ou seculares. Estes passaram a viver então em comunidade sob uma regra, como sacerdotes regulares. Isso se tornou depois na Igreja muito comum até tempos recentes. Entretanto, os primeiros religiosos a levar esse modelo de vida tinham sido os Teatinos, fundados por São Caetano de Tiene em Roma, em 1524.
Quando os Clérigos Regulares Menores perfizeram o número de doze, Ascânio e Agostinho dirigiram-se a Roma para tentar a aprovação de sua Ordem. Ao recebê-los Sixto V (1521-1590) – grande amigo de São Felipe Neri e de Santo Inácio de Loyola –, com aquela doçura e amabilidade que o caracterizavam, fixou neles seu bondoso e penetrante olhar e, agradabilissimamente surpreso pela prodigiosa sabedoria, piedade e prudência do mais jovem, Ascânio – que tinha somente25 anos –, encomendou o exame do projeto da nova ordem religiosa a uma comissão de três cardeais, que ele mesmo nomeou. Apenas dois meses depois e contra toda esperança, no dia 1º. de julho de 1588, Sixto V expediu a bula criando a Ordem dos Clérigos Regulares Menores.
Em setembro de 1591 João Agostinho Adorno faleceu em odor de santidade, com apenas 40 anos. São Francisco foi escolhido por unanimidade como Superior Geral dos Menores.
Tempos depois, quando São Francisco Carcciolo foi fundar a primeira casa de sua Ordem na Espanha, dedicada ao glorioso patriarca São José, a obra progrediu tanto a olhos vistos, que suscitou o ódio dos adversários que toda obra de Deus encontra. Assim, um poderoso senhor da Corte com muita influência, conseguiu que o Conselho real mandasse fechar imediatamente essa casa, concedendo um prazo de dez dias para que os religiosos saíssem do país. Depois de várias tentativas infrutíferas, como último recurso São Francisco foi lançar-se aos pés do rei Felipe II, implorando sua ajuda. O monarca ficou de tal maneira impressionado com o Santo que, contra o parecer de seu Conselho Real, ratificou a fundação, autorizando a permanência dos religiosos no país. Esse piedoso monarca fora também o responsável, a pedido de Santa Teresa, pela aprovação da Ordem dos Carmelitas Descalços.
Voltando à Itália, por humildade o fundador escolheu como aposento na casa de Nápoles um vão em baixo da escada, muito pequeno e incômodo. Lá entrava frequentemente em êxtase. Foi lá que os eclesiásticos o encontraram, vindos da parte do papa Paulo V, oferecer-lhe um episcopado, que ele rejeitou.
Estando na Santa Casa de Loreto passando a noite em oração, São Francisco viu-se de repente rodeado por uma claridade celeste, aparecendo-lhe então Agostinho Adorno, resplandecente de luz: “Caríssimo irmão, disse-lhe ele, sou mensageiro de Maria para dizer-te da parte dessa bondosa Mãe, que Ela amorosamente cobre com seu manto nossa família, convertendo-se desde já sua Protetora e Advogada. Deu-me Ela outro encargo: de dizer-te que, dentro de poucos dias, serás chamado à bem-aventurança eterna”.
Pouco depois o Santo foi atacado por uma febre cada vez mais alta, falecendo no dia 4 de junho de 1608, aos 44 anos. Francisco Caracciolo foi beatificado por Clemente XIV em 10 de setembro de 1769, e canonizado por Pio VII em 27 de maio de 1807. O Martirológio Romano diz desse santo neste dia: “Em Agnone, no Abruzzo, São Francisco, da nobre família napolitana dos Caracciolo, confessor, fundador da Congregação dos Clérigos Regulares Menores, que vivia abrasado de admirável caridade para com o próximo, e de ardentíssimo zelo pela propagação do culto à Sagrada Eucaristia. Foi inscrito no cânon dos Santos pelo Sumo Pontífice Pio VII. O corpo foi trasladado para Nápoles, na Campânia, onde é objeto de grande veneração”.